– Obrigado pela sua paciência, menina Calloway – diz o detetive. A sua expressão continua a ser completamente neutra. – Tenho algumas perguntas para si sobre o senhor Garrick.
– Está bem – aquiesço. Estamos a ser gravados, por isso mantenho um tom calmo e comedido.
– Onde esteve ontem à noite? – pergunta-me Ramirez.
– Fui ao apartamento dos Garrick fazer algumas limpezas ligeiras e tratar da roupa e a seguir fui para casa.
– A que horas saiu do apartamento?
– Por volta das seis e meia – respondo.
– E falou com o senhor Garrick enquanto lá esteve? Abano a cabeça, lembrando-me do que a Wendy me disse. Temos simplesmente de manter as nossas histórias coesas e devemos ficar bem.
– Não.
Ramirez parece surpreendido com a minha resposta.
– Então, o senhor Garrick não lhe pediu para se encontrarem no apartamento ontem à noite?
Pestanejo, confusa.
– Não...
– Menina Calloway. – Os olhos do detetive parecem escurecer enquanto me fita. – Qual é a sua relação com Douglas Garrick?
– A minha relação? – Olho para o Brock, que está de sobrolho franzido. – É o meu empregador. Bem, ele e a mulher, a Wendy.
– Têm uma relação sexual?
Quase me engasgo.
– Não!
– Nem uma vez?
Quero estender os braços e abanar o detetive, mas, felizmente, o Brock intervém.
– A menina Calloway já respondeu à sua pergunta. Não tem nenhum tipo de relacionamento com o senhor Garrick além do puramente profissional.
O detetive Ramirez agarra na pasta que pousou ao seu lado na mesa. Tira um bloco de papéis agrafados, que faz deslizar na minha direção.
– Encontrámos um telemóvel pré-pago na gaveta da cómoda do senhor Garrick. Essas foram as mensagens de texto trocadas entre o telemóvel pré-pago e o seu.
Agarro nos papéis e começo a examiná-los enquanto o Brock espreita por cima do meu ombro. Reconheço as mensagens. São as que Douglas me enviou ao longo dos últimos meses para confirmar os meus dias de trabalho. Mas, fora do contexto, parecem adquirir um sentido diferente.
Passa lá por casa esta noite ?
Vemo-nos logo à noite.
Venha esta noite.
Além do mais, todas as minhas mensagens sobre compras e roupa desapareceram. Cada mensagem parece envolver o planeamento de encontros. Os olhos do Brock saltam-lhe das órbitas ao ler as mensagens de texto.
– Sim, são as nossas mensagens – confirmo. – Mas são todas sobre o trabalho.
– O senhor Garrick enviava-lhe mensagens sobre o trabalho de um telemóvel pré-pago?
Cerro os dentes.
– Não sabia que era um telemóvel pré-pago. Pensava que era simplesmente o seu telemóvel normal.
– Compreendo – diz Ramirez.
– Além do mais – acrescento havia outras mensagens. Maioritariamente sobre compras e roupa. Não estão aqui... parecem ter sido apagadas.
– Tem as mensagens no seu telemóvel?
– Não... – Porque a Wendy me disse para as apagar. – Livrei-me de todas as mensagens.
– Porquê?
– Por que não haveria de o fazer? – Solto uma risada que soa demasiado aguda. – Quer dizer, o detetive guarda todas as mensagens que recebe?
Provavelmente, sim. Provavelmente, tem no seu telemóvel mensagens de texto que remontam há dez anos. Embora deva admitir que jamais teria apagado aquelas mensagens, se a Wendy não me tivesse dito para o fazer.
– Além disso – continua –, havia chamadas feitas para si a horas tão tardias como a meia-noite. Está a dizer que o
Seu patrão lhe ligava à meia-noite?
– Só aconteceu uma vez – respondo debilmente.
Reconheço quão fraco tudo isto soa. Não faz sentido –
por que andava Douglas a enviar-me mensagens de texto de um telemóvel pré-pagol Não é como se me estivesse a preparar para arcar com as culpas pelo seu próprio homicídio. Olho para o Brock, que ficou estranhamente silencioso na pior altura possível.
– Além do mais... – Ramirez abre novamente a pasta. Oh, meu Deus, há mais? Como pode haver mais? – Reconhece isto?
É uma granulosa fotografia impressa de uma pulseira. Reconheço-a como a mesma pulseira que Douglas ofereceu a Wendy depois de lhe ter posto aquele olho negro.
– Sim – respondo. – É a pulseira da Wendy.
Ramirez arqueia as sobrancelhas.
– Então por que a encontrámos num guarda-joias no seu apartamento?
– Ela... ela deu-ma.
As sobrancelhas do detetive aproximam-se ainda mais da linha do couro cabeludo.
– A Wendy Garrick deu-lhe uma pulseira de diamantes de dez mil dólares?
Uma pulseira de dez mil dólares? Foi isso que aquela pulseira custou? Tive algo no valor de dez mil dólares no meu pequeno e miserável guarda-joias?
– Disse-me que tinha sido um presente do marido – digo.
– E quanto à inscrição? – Tira ainda outra fotografia da pasta e passa-ma. – Parece-lhe familiar?
A inscrição que eu tinha lido na pulseira da Wendy está agora ampliada na imagem, pelo que tanto eu como o Brock a podemos ler claramente.
Vara W. És minha para sempre. Com amor, D.
– Certo – digo eu. – Para W. Para Wendy.
Ramirez bate na foto.
– O seu nome não começa por W? Wilhelmina?
– Eu... – Subitamente, sinto a boca seca. Espero que o Brock intervenha e proteste contra esta linha de interrogatório, mas continua mudo, também à espera de ouvir a minha resposta. – Respondo sempre por Millie.