Mas eu não vou alvejar Douglas. Isso está fora de questão. A minha única intenção é assustá-lo. Afinal, não há nada mais assustador do que uma arma. Conto com o fator surpresa para pôr termo à situação.
Com o revólver aninhado na mão, apresso-me a descer novamente o corredor escuro até ao quarto de hóspedes. A discussão cessou e tudo está em silêncio no interior do quarto. E, de alguma forma, isso é o mais assustador de tudo.
Pondero bater, mas então decido tentar o puxador. Roda facilmente na minha mão. Enquanto abro a porta, uma voz fala-me do fundo da minha cabeça:
Mas é demasiado tarde.
Abro a porta do quarto de hóspedes. A visão diante dos meus olhos deixa-me sem fôlego. Douglas e Wendy. Tem-na encostada à parede, as mãos apertadas sobre a sua garganta, e o rosto da Wendy começa a ficar azul. Tem a boca aberta para gritar, mas nenhum som consegue emergir.
Oh, meu Deus, está a tentar matá-la.
Não sei se a vai estrangular ou partir-lhe o pescoço com as próprias mãos, mas tenho de fazer alguma coisa e já –não posso ficar simplesmente aqui parada e deixar que isto aconteça. Mas aprendi com os erros do passado. Posso ter uma arma, mas não tenho a menor intenção de o matar. A ameaça deve ser suficiente. E depois direi à polícia o que vi.
Tu consegues, Milite. Não o magoes. Obriga-o apenas a soltá-la.
– Douglas! – grito-lhe. – Largue-a!
Espero que se afaste dela, cheio de falsas desculpas e explicações. Mas, de alguma forma, os seus dedos não cedem. A Wendy solta outro gorgolejo.
Por isso, agarro na arma e aponto ao peito.
– Falo a sério. – A minha voz treme. – Largue-a ou disparo.
Mas Douglas, por alguma razão, não ouve o que eu lhe digo. Tem o olhar desvairado e parece decidido a acabar com isto – aqui e agora. A Wendy parou de o arranhar e o seu corpo ficou lânguido. O tempo para negociar acabou. Se eu não fizer algo nos próximos segundos, vai matá-la.
E eu terei deixado que isso acontecesse.
-Juro por Deus – crocito –, ou a larga ou disparo!
Mas não a larga. Continua simplesmente a apertar.
Não tenho escolha. Só há uma coisa a fazer.
Primo o gatilho.
39
Douglas fica frouxo segundos depois de o tiro ecoar pelo apartamento. É mais alto do que eu esperava, suficientemente forte para os vizinhos terem certamente ouvido. Bem, talvez não. As paredes e tetos são provavelmente insonorizados num sítio como este, e temos o piso por baixo de nós como tampão.
Pelo lado positivo, os dedos de Douglas escorregam do pescoço da Wendy, que cai de joelhos, tossindo e chorando e agarrando-se à garganta. O marido jaz ao seu lado no chão, o corpo inerte. Ao fim de um segundo, uma poça carmesim começa a alastrar-se pela sumptuosa alcatifa.
Oh, não.
Outra vez não.
A arma cai-me dos dedos e aterra no chão ao meu lado com um forte baque. Sinto-me completamente paralisada. Douglas Garrick não se mexe de todo, e a poça debaixo dele continua a crescer. A minha intenção era atingi-lo no ombro, o suficiente para o ferir e o obrigar a tirar as mãos da Wendy, mas não o suficiente para o matar.
Parece que falhei.
A Wendy esfrega os olhos lacrimosos. Miraculosamente, ainda está consciente. Ajoelha-se ao lado do marido, pondo-lhe uma mão no pescoço, sobre a artéria carótida. Mantém-na lá por um momento, erguendo depois os olhos para mim.
– Não tem pulsação.
Oh, meu Deus!
– Está morto – sussurra, em voz rouca. – Está realmente morto.
– Não queria matá-lo – gaguejo. – Estava... estava só a tentar fazê-lo tirar-lhe as mãos de cima. Nunca foi minha intenção...
– Obrigada – diz a Wendy. – Obrigada por me salvar a vida. Sabia que o faria.
Por um momento, ficamos apenas a olhar uma para a outra. É certo que lhe salvei a vida. Tenho de me lembrar disso. É o que terei de explicar à polícia quando chegar.
– Tem de ir – diz a Wendy, levantando-se, apesar de as suas pernas parecerem trémulas. – Nós... podemos limpar as impressões digitais da arma. Isso deve resultar, não deve? Sim, sim, estou certa de que resultará. Esperarei um par de horas para ligar à polícia, e depois digo-lhes... Oh! Posso dizer que pensei que o Douglas era um intruso e lhe dei um tiro por acidente. Foi tudo um acidente, sabe? Acreditarão nisso. De certeza que sim.
Fala aceleradamente – está em pânico. Por mais que adorasse ver-me livre das consequências, há um enorme buraco na sua história.
– Mas o porteiro viu o Douglas entrar no prédio.
Ela abana a cabeça.
– Não, não viu. Alguns dos residentes têm acesso à entrada das traseiras, o Douglas entra sempre por lá.
– Há lá alguma câmara?
– Não, nenhuma.
– E quanto às dos elevadores?
– Essas? – solta um resfolego. – São meramente decorativas. Uma avariou há cinco anos e a outra está fora de serviço há pelo menos dois.
Poderia isto realmente funcionar? Acabo de alvejar Douglas Garrick a sangue-frio. Haverá alguma hipótese de eu poder sair disto sem consequências? Por outro lado, não seria a primeira vez.