O Brock olha-me fixamente enquanto agarro no meu copo e corro para a cozinha. Enfio o copo debaixo do filtro de água, desejando por uma vez que esta corresse um pouco mais devagar. Enquanto estou a encher o copo, o meu telemóvel começa a vibrar no meu bolso. Alguém está a ligar-me.
O nome da Wendy aparece no ecrã. Fiquei com o seu número, para o caso de algo correr mal com o nosso plano de fuga e ela precisar da minha intervenção. Mas deixou esse telemóvel para trás na penthouse. Por que me está a ligar agora, então?
Atendo a chamada, baixando a voz para o Brock não poder ouvir. Estou certa de que não aprovaria nada disto, e é particularmente importante não lhe dizer uma palavra, uma vez que aparentemente conhece Douglas Garrick e considera-o um tipo simpático.
– Wendy – sussurro. – O que se passa?
Por um segundo, oiço apenas silêncio do outro lado da linha. Depois, o som de um soluçar baixinho.
– Estou de volta. Ele trouxe-me de volta.
– Oh, meu Deus...
– Millie – falha-lhe a voz –, pode vir aqui, por favor?
O apartamento do Brock fica a apenas quinze minutos a pé da penthouse. Podia estar lá em vinte. Mas como posso? Acabo de iniciar uma discussão séria com o meu namorado, que provavelmente levará o resto da noite.
Mas o Brock não precisa tanto de mim quanto a Wendy.
– Estarei aí em breve – prometo-lhe.
Deixo o meu copo de água na cozinha e volto a sair para a zona de jantar. O Brock mal parece ter tocado na sua massa PadThai desde que eu saí da sala.
– Então? – pergunta.
– Ouve – digo. – Surgiu uma emergência. Tenho... tenho de ir.
– Agora?
– Peço imensa desculpa – respondo. – Falamos amanhã à noite. Prometo.
O Brock projeta o lábio inferior.
– Millie...
– Prometo – imploro com o olhar. – E... adoraria conhecer
os teus pais. Acho que vai ser ótimo.
Essa última afirmação parece aplacá-lo.
– Sei que estás nervosa com a ideia de conhecer os meus pais – diz mas vais adorar a minha mãe. Também é de Brooklyn. Andou na Universidade de Brooklyn e também tem o mesmo sotaque que tu.
– Eu não tenho sotaque!
– Tens, sim – sorri. – Um sotaque ligeiro. É giro.
– Pois, pois...
Erguendo-se da mesa, estende-me os braços. Apesar de estar em pulgas por correr para a penthouse, deixo-o abraçar-me.
– Quero só que saibas – diz o Brock – que, seja qual for a coisa terrível que sentes que precisas de me contar sobre ti, está tudo bem. Amar-te-ei de qualquer forma.
Olho para os seus olhos azuis e consigo perceber que está a falar a sério.
– Falaremos disto em breve – prometo. – E... também te amo.
Torna-se mais fácil de cada vez que o digo.
Beija-me profundamente e, por um momento, desejo verdadeiramente não ter de partir. Mas não tenho escolha.
34
As engrenagens do elevador rangem mais do que o habitual.
Pergunto-me quantos anos tem este elevador. Li algures que começaram a ser utilizados em casas particulares nos finais dos anos 1920. Portanto, mesmo que este seja um dos primeiríssimos da história, tem, ainda assim, menos de um século. O que é reconfortante, suponho.
No entanto, um destes dias, estou certa de que todas estas velhas engrenagens vão enferrujar em pleno andamento e eu ficarei simplesmente presa neste elevador para o resto da vida.
Olho para o meu relógio. Passaram menos de vinte minutos desde que a Wendy ligou. Tentei ligar-lhe de volta para lhe dizer que estava a caminho, mas não atendeu. Temo o que vou encontrar quando chegar ao vigésimo andar.
Meu Deus, pode este elevador andar mais devagar? Finalmente, o elevador para com um rangido e as portas abrem-se. O sol desceu no céu e o apartamento está às escuras. Por que não acendeu ninguém as luzes? O que se passa aqui?
– Olá? – chamo.
Ocorre-me então um pensamento terrível.
E se Douglas está aqui? Se obrigou a Wendy a ligar-me e a pedir-me para vir, a fim de me poder castigar por a ter ajudado? Parece o tipo de coisa de que seria capaz.
Às cegas, vasculho a minha bolsa à procura do gás-pimenta. Encontro-o junto ao meu pó compacto e tiro-o, apertando-o na mão direita.
– Wendy? – grito.
Com a mão esquerda, vou ao bolso das minhas calças de ganga, onde enfiei o telemóvel. Não quero ligar à polícia, mas, ao mesmo tempo, tenho um pressentimento terrível sobre o que vou encontrar neste apartamento.
Entro na sala de estar, os meus passos no soalho altos como tiros neste silencioso e vazio apartamento. O meu coração para ao ver as manchas vermelhas no tapete. E, depois, o corpo estendido no sofá modular.
– Wendy! – exclamo.
É muito pior do que eu pensava. Douglas não anda à procura da mulher ou a tentar exercer vingança. Já a encontrou e, agora, jaz morta no sofá. Corro para ela, esperando ver um ferimento de faca ainda aberto no seu peito e uma mancha carmesim na frente do seu vestido azul-escuro. Mas não vejo nada disso.
E, então, abre os olhos.
– Wendy! – Sinto-me como se estivesse prestes a morrer de ataque cardíaco. Oxalá tivesse alguma da medicação do Brock disponível, pois o meu coração adotou um ritmo insano e irregular. – Oh, meu Deus! Pensei que estava...