Apesar de andarmos a dormir juntos há já seis meses, não consigo parar de olhar para o homem do outro lado da mesa. Para o seu espesso cabelo cor de chocolate, cortado curto dos lados, mas suficientemente longo no topo para encaracolar ligeiramente, e para as suas densas e poderosas sobrancelhas. Nunca antes descrevi umas sobrancelhas como «poderosas», mas o homem podia comandar uma sala com elas. São o meu traço preferido nele. Ainda que, para ser justa, adore tudo o que o compõe.
Exceto a sua conta bancária.
A empregada aproxima-se da nossa mesa, um sorriso de orelha a orelha plasmado no rosto. Num restaurante tão caro, o pessoal é sempre inquebrantavelmente simpático. O Douglas odeia sítios assim. Não me agrada quando se alvoroçam tanto comigo.
– Vão querer sobremesa? – pergunta-nos a empregada.
– Temos um incrível bolo de chocolate sem farinha.
– Não, obrigado – responde o Russell.
Aceno em concordância. Nunca comemos sobremesa. Tal como eu, o Russell cuida bem de si mesmo. Vai ao ginásio várias vezes por semana, e o seu corpo é todo músculo esculpido, com apenas uma ligeira e inevitável barriga de meia-idade. Pena que a Marybeth não lhe dê valor. Nem se dá ao trabalho de pintar o seu cabelo louro – em poucos anos, estará grisalha como uma mula.
O Russell estende os braços sobre a mesa para agarrar as minhas mãos. Dado que estamos em público e somos ambos casados, é completamente inapropriado. Nas últimas semanas do nosso tórrido caso, porém, mandámos um pouco a cautela ao vento. Parte de mim quase quer ser apanhada. Porque, pela primeira vez na minha vida, estou apaixonada.
Se o Douglas se quiser divorciar de mim, agarro nos meus dez milhões e vou à minha vida.
– Oxalá não tivesse de voltar para o trabalho – murmura o Russell.
– Talvez possas chegar atrasado? – sugiro.
Um sorriso brinca-lhe nos lábios. Adoro a sua avidez. O Douglas deixou de ser assim pouco depois de nos casarmos e, mesmo antes, nunca foi tão competente na cama como o Russell. Simplesmente não tinha a mesma energia.
Nos primeiros tempos, reservávamos quartos de hotel para os nossos encontros, mas ultimamente o Douglas raramente vai à penthouse, pelo que tenho simplesmente levado o Russell para lá. Há a entrada das traseiras, onde sei que não há câmaras, pelo que não temos de lidar com o olhar do porteiro.
– Não devia – diz. – A loja tem estado movimentada nos últimos tempos.
– Não é para isso que servem os vendedores?
Geralmente, o Russell tem um ajudante a trabalhar na loja, embora talvez pudesse contratar mais um, dado que praticamente tenho andado a financiar o negócio com as minhas compras. Para ser justa, adorei cada bela antiguidade que lá comprei. O Russell tem um gosto impecável. Se tivesse dinheiro, saberia verdadeiramente como o gastar.
– Que tal esta noite? – sugere.
– Então e a Marybeth?
Os seus lábios curvam-se de repugnância, como sempre acontece quando o tema da sua mulher é evocado. É algo que nos aproximou – a nossa mútua aversão pelos nossos cônjuges.
– Digo-lhe que vou ficar outra vez a trabalhar até tarde.
A empregada regressa com a conta, e eu entrego-lhe o meu cartão platina. Sou sempre eu a pagar quando vamos a restaurantes sofisticados, pois, embora não goste de o admitir, o Russell está um pouco apertado em termos de dinheiro. Mas isso não me incomoda. Não é pelo dinheiro que gosto dele – tenho bem que chegue neste momento.
– Vou contar os segundos para te ver esta noite – murmura o Russell. Debaixo da mesa, os seus dedos sobem-me pela saia até eu me começar a sentir um pouco ofegante.
– Russell – rio-me baixinho. – Aqui não. Há pessoas em volta.
– Não me consigo conter perto de ti.
– Russell...
A minha fruição do que o meu amante está a fazer debaixo da mesa é interrompida pelo pigarrear da empregada. Tem o meu cartão platina na mão.
– Lamento muito, mas não passou. Foi rejeitado.
Reviro os olhos.
– É das vossas máquinas. Por favor, volte a passá-lo.
– Tentei três vezes.
Solto um suspiro. Meu Deus, as pessoas nestes restaurantes são simpáticas, mas às vezes são também dolorosamente incompetentes. Por alguma razão estão a servir às mesas para ganhar a vida. Vou à minha bolsa e tiro o meu Visa.
– Tente este.
Só que, passado um minuto, a empregada regressa com o segundo cartão.
– Este também foi rejeitado – informa-me. O seu tom já não é tão delicado como quando nos estava a servir. E as pessoas da mesa ao lado começaram a olhar.
Não sei o que se passa. Sou casada com o Douglas Garrick, caramba. O meu limite de crédito é infinito. Tem nitidamente de ser um problema do lado deles, mas mais ninguém parece estar a ter dificuldades.
– Tente o meu cartão – intervém o Russell. Tira o seu cartão de crédito da carteira e entrega-o.
Enquanto a empregada se afasta para experimentar o novo cartão, lanço-lhe um olhar apologético.
– Desculpa. Não sei o que se passa.