A Audrey olha para mim, espantada, e eu sinto as maçãs do rosto corar. Será a Millie alguém importante no nosso círculo social de quem eu me esqueci, de algum modo? Mas, então, a Audrey responde:
– É uma empregada de limpeza.
– Certo...
– Mas tem uma reputação... – A Audrey baixa ligeiramente a voz, o que significa que está prestes a contar-me um mexerico realmente bom. – Ajuda as mulheres que têm problemas com os maridos. Trata do assunto por elas.
– Problemas?
Mentalmente, percorro a lista de maus hábitos do Douglas. Quando vai à casa de banho, usa sempre metade do rolo de papel higiénico. Come diretamente dos recipientes no frigorífico, apesar de eu lhe ter pedido repetidamente para não o fazer. Quando vamos a um restaurante fino, não se dá ao trabalho de aprender que garfo utilizar em que altura, e mesmo quando eu lho saliento ao início da refeição, continua a errar metade das vezes, o que me leva a pensar que está apenas a adivinhar.
Costumava pensar que podia mudar o Douglas. Que, com a minha ajuda, poderia tornar-se uma pessoa melhor, como eu. Mas só parece estar a piorar.
– Problemas graves – esclarece a Audrey. – Tipo, o marido da Ginger era abusivo. Batia-lhe. Chegou mesmo a partir-lhe o braço.
– Oh! – arquejo. Não posso dizer que tenha esse problema. O Douglas jamais me encostaria um dedo. Ficaria horrorizado com a ideia. – Que horror.
Ela assente sobriamente.
– Então, essa tal Millie dá uma ajuda. Diz às mulheres o que dizer e fazer. Arranja-lhes os recursos certos. Arranjou um excelente advogado à Ginger. E até ouvi dizer que ajudou algumas mulheres a desaparecer quando era essa a única opção.
– Uau.
– E não é tudo. – A Audrey mastiga uma das suas folhas de alface, limpando em seguida os lábios com o guardanapo. – Ouvi dizer que, num par de situações em que não havia saída, a Millie... enfim, despachou o tipo.
Tapo a boca.
– Não...
– Sim! – A Audrey parece encantada por estar a partilhar esta revelação. – É dura, acredita. É perigosa. Se achar que um tipo anda a fazer mal a uma mulher, fará basicamente tudo para o parar. Foi para a prisão por arrear porrada num tipo que estava a tentar violar a amiga. Matou-o.
– Céus...
A Audrey come outra garfada da sua salada e afasta-a.
– Estou tão cheia – anuncia, apesar de mal ter comido metade e de ser apenas uma pequena salada verde para entrada. – Wendy, de certeza que não queres comer nada?
Bebo um gole da minha mimosa.
– Tomei um pequeno-almoço enorme.
Ela semicerra os olhos na minha direção, possivelmente porque não pedi qualquer comida durante os nossos três últimos almoços juntas. Mas tomo sempre uma bebida.
– Suponho que não estejas a ter sorte com a questão do bebé – observa.
Amaldiçoo o facto de, há alguns meses, ter referido casualmente que o Douglas estava entusiasmado pela ideia de ter filhos em breve. Simplesmente escapou-me. Há já cerca de um ano que andamos a tentar ter um bebé. Não tem corrido bem – ou seja, não estou grávida.
– Ainda não – respondo.
– Conheço um especialista em fertilidade fabuloso – diz a Audrey. – A Laura foi vê-lo, e olha para ela agora.
A nossa amiga Laura tem agora dois rapazinhos gémeos, que não paravam de gritar da última vez que me cruzei com ela na rua. Retraio-me.
– Deixa estar. Preferimos tentar à moda antiga.
– Sim, mas não vais para nova – lembra-me ela. – Tique-taque, Wendy.
– Tudo bem. Dá-me o nome desse médico.
Gravo o número no meu telemóvel, embora não tenha intenção de ligar. Mas, se o Douglas me perguntar pelo assunto, posso ao menos fingir que estou a fazer alguma coisa.
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Passo 4: Perceber que Você e o Seu Marido São Completamente Errados Um para o Outro
Um ano antes
O Douglas entra na sala de jantar da nossa casa em Long Island e para bruscamente ao ver os dois lugares à mesa.
– Onde está o resto do nosso jantar? – pergunta. – Na cozinha?
– Não. – Já estou sentada à mesa, com um guardanapo no colo. – É isto o nosso jantar. A Blanca fez-nos uma salada.
O Douglas olha para a taça de verduras como se lhe tivessem servido veneno.
– É isto? É só isto o jantar?
Suspiro. Lembro-me de reparar na papada do Douglas no dia em que o conheci; nessa noite, jurei pô-lo em forma para que desaparecesse. Mas, quando muito, está ainda menos em forma do que nessa noite. Sinceramente, é como se nem se importasse.
– É alface, tomate, pepino e cenoura ralada – indico-lhe. – Comer salada todos os dias é o que me impede de ficar inchada. Devias experimentar.
– Wendy, és um pau de virar tripas – afirma. – Apavora-te a ideia de comer seja o que for que não seja uma folha de alface ou um talo de aipo.
Reteso-me.
– Estou só a manter-me saudável.
– Estou preocupado contigo. – De cenho franzido, senta-se diante da ofensiva salada. – Nunca comes nada. E ontem desmaiaste depois da tua corrida.
– Não desmaiei nada!
– Desmaiaste, sim! Estavas tão pálida, e depois sentaste-te no sofá e eu não te conseguia acordar. Estive quase a chamar uma ambulância.