– Passam três horas da meia-noite. A cidade dorme. – Jaime voltou a enfiar o archote na arandela, na parede entre as celas.
O corredor estava tão mal iluminado que Tyrion quase tropeçou no carcereiro, estatelado no frio chão de pedra. Empurrou-o com a ponta do pé.
– Está morto?
– Dormindo. Os outros três também. O eunuco misturou sonodoce no vinho deles, mas não o suficiente para matá-los. Pelo menos foi o que me jurou. Está esperando na escada, vestido com uma túnica de septão. Vai descer aos esgotos, e dali vai para o rio. Uma galé está esperando na baía. Varys tem agentes nas Cidades Livres que se assegurarão de que não lhe faltem fundos... mas tente não se fazer notar. Cersei mandará homens em seu encalço, não duvido. Pode ser boa ideia adotar outro nome.
– Outro nome? Oh, certamente. E quando os Homens Sem Rosto vierem me matar, direi: “Não, enganou-se de homem, eu sou
– Obrigado, irmão – disse Tyrion. – Pela minha vida.
– Era... uma dívida que tinha para com você. – A voz de Jaime soava estranha.
– Uma dívida? – inclinou a cabeça. – Não compreendo.
– Ainda bem. Há portas que é melhor que fiquem fechadas.
– Ora, ora – disse Tyrion. – Haverá algo de sinistro e feio atrás disso? Será possível que alguém um dia tenha dito algo
– Tyrion...
– Conte-me – repetiu Tyrion.
O irmão afastou o olhar.
– Tysha – disse em voz baixa.
– Tysha? – seu estômago apertou-se. – O que tem ela?
– Não era uma prostituta. Não fui eu que a trouxe para você. Aquilo foi uma mentira que o pai me ordenou que dissesse. Tysha era... era o que parecia ser. Filha de um caseiro, encontrada por acaso na estrada.
Tyrion conseguia ouvir o tênue som da própria respiração assobiando através da cicatriz do nariz. Jaime não era capaz de encará-lo.
– A minha esposa – crocitou. – Ela casou comigo.
– Pelo seu ouro, disse o pai. Era malnascida, e você, um Lannister de Rochedo Casterly. Tudo que ela queria era o ouro, o que fazia com que não fosse diferente de uma prostituta, portanto... portanto não seria uma mentira, não por completo, e... ele disse que você precisava de uma dura lição. Que aprenderia com ela e me agradeceria mais tarde...
–
– Eu não sabia que ele ia fazer isso. Tem de acreditar em mim.
– Ah,
– Tyrion...
Tyrion bateu nele. Foi um tabefe, dado com as costas da mão, mas colocou nele todas as suas forças, todo o seu medo, toda a sua raiva, toda a sua dor. Jaime estava acocorado, desequilibrado. O golpe fez com que tropeçasse e caísse de costas.
– Eu... suponho que mereci isso.
– Oh, você mereceu mais do que isso, Jaime. Você e a minha querida irmã e o nosso dedicado pai, sim. Nem consigo começar a dizer o que mereceram. Mas terão o que merecem, isso posso jurar para você. Um Lannister sempre paga as suas dívidas. – Tyrion afastou-se, bamboleando, quase voltando a tropeçar no carcereiro com a pressa. Antes de percorrer uma dúzia de metros deu um encontrão num portão de ferro que fechava a passagem.
Jaime surgiu atrás dele.
– Eu tenho as chaves do carcereiro.
– Então use-as. – Tyrion abriu-lhe passagem.
Jaime destrancou o portão, abriu-o e atravessou-o. Olhou para trás por sobre o ombro.
– Você vem?
– Não com você. – Tyrion atravessou o portão. – Dê-me as chaves e vá embora. Eu encontro Varys sozinho. – Inclinou a cabeça e fitou o irmão com seus olhos desiguais. – Jaime, consegue lutar com a mão esquerda?
– Bastante pior do que você – disse amargamente Jaime.
– Ótimo. Nesse caso estaremos bem equilibrados se alguma vez voltarmos a nos encontrar. O aleijado e o anão.
Jaime entregou-lhe a argola cheia de chaves.
– Ofereci a verdade a você. Deve-me o mesmo. Foi você? Matou-o?
A pergunta era outra faca, torcendo-se em suas tripas.
– Tem certeza de que quer saber? – perguntou Tyrion. – Joffrey teria sido um rei pior do que Aerys alguma vez foi. Ele roubou o punhal do pai e deu-o a um salteador para que cortasse a goela de Brandon Stark, sabia disso?
– Eu... achei que pudesse ter feito isso.