– É um verdadeiro rei? – perguntou Jon subitamente.
– Nunca tive uma coroa na cabeça nem sentei o traseiro na porcaria de um trono, se é isso o que está perguntando – respondeu Mance. – Meu nascimento é tão baixo quanto poderia ser, nenhum septão me besuntou a cabeça com óleos, não sou dono de castelos, e a minha rainha usa peles e âmbar, e não seda e safiras. Sou o meu próprio campeão, o meu próprio bobo e o meu próprio harpista. Não se torna Rei-para-lá-da-Muralha por causa de quem foi o seu pai. O povo livre não seguirá um nome e não se importa com qual dos irmãos nasceu primeiro. Segue lutadores. Quando abandonei a Torre Sombria, havia cinco homens fazendo barulho a respeito de como eles mesmos podiam ser do material de que são feitos os reis. Tormund era um, o Magnar, outro. Matei os outros três, quando deixaram claro que preferiam lutar a me seguir.
– Pode matar seus inimigos – disse Jon sem rodeios –, mas será capaz de governar seus amigos? Se deixarmos seu povo passar, é suficientemente forte para fazê-los manter a paz do rei e obedecer às leis?
– Às leis de quem? Às leis de Winterfell e de Porto Real? – Mance soltou uma gargalhada. – Quando quisermos leis, faremos as nossas. Pode ficar também com a sua real justiça e os seus reais impostos. Estou oferecendo-lhe o berrante, não a nossa liberdade. Não nos ajoelharemos perante vocês.
– E se recusarmos a proposta? – Jon não tinha dúvida de que recusariam. O Velho Urso poderia pelo menos ter escutado, embora recusasse diante da ideia de deixar trinta ou quarenta mil selvagens à solta nos Sete Reinos. Mas Alliser Thorne e Janos Slynt descartariam a ideia logo de cara.
– Se recusarem – disse Mance Rayder –, Tormund Terror dos Gigantes fará soar o Berrante do Inverno dentro de três dias, ao nascer do dia.
Levaria a mensagem para Castelo Negro e contaria a eles sobre o berrante, mas se deixasse Mance vivo, Lorde Janos e Sor Alliser usariam isso como prova de que era um vira-casaca. Mil pensamentos passaram pela cabeça de Jon.
O berrante de guerra era mais sonoro lá fora. Seu chamado tinha agitado o acampamento dos selvagens. Cavalos relinchavam e resfolegavam, gigantes rugiam no Idioma Antigo e até os mamutes estavam inquietos.
– Berrante de batedor – disse Tormund a Mance.
– Alguma coisa vem aí. – Varamyr estava sentado de pernas cruzadas no chão meio congelado, com os lobos descrevendo círculos agitadamente em volta dele. Uma sombra pairou por cima dele, e Jon ergueu o olhar para ver as asas azul-acinzentadas de uma águia. – Vem do leste.
“Quando os mortos caminham, muralhas, estacas e espadas não significam nada, recordou. Não pode lutar com os mortos, Jon Snow.”
Harma franziu as sobrancelhas.
– Do leste? As criaturas deviam estar atrás de nós.
– Do leste – repetiu o troca-peles. –
– Os Outros? – perguntou Jon.
Mance sacudiu a cabeça.
– Os Outros nunca vêm quando o sol está no céu. – Bigas chocalhavam através do campo de morte, transbordando de guerreiros que brandiam lanças de osso afiado. O rei gemeu. – Onde eles pensam que vão, porra? Quenn, leve aqueles idiotas de volta às suas posições. Alguém me traga o cavalo. A égua, não o garanhão. Também vou querer a minha armadura. – Mance deu um relance desconfiado à Muralha. No topo das ameias geladas, os soldados de palha mantinham-se em pé, colecionando flechas, mas não havia sinal de mais nenhuma atividade. – Harma, ponha em campo os seus batedores. Tormund, vá à procura de seus filhos e arranje uma linha tripla de lanças.
– Sim – disse Tormund, afastando-se a passos largos.
O pequeno troca-peles com ar de rato fechou os olhos e disse:
– Estou vendo-os. Aproximam-se ao longo dos riachos e das trilhas de caça...
–
– Homens. Homens a cavalo. Homens vestidos de aço e homens vestidos de negro.
– Corvos. – Mance transformou a palavra numa praga. Virou-se para Jon. – Será que os meus antigos irmãos pensaram que me apanhariam de calças arriadas se atacassem enquanto estivéssemos conversando?