Tinham-no tirado para fora naquela manhã, depois de quatro dias passados no gelo, fechado numa cela de um metro e meio por um metro e meio por um metro e meio, baixa demais para se pôr em pé, apertada demais para se deitar de costas. Os intendentes tinham há muito descoberto que a comida e a carne duravam mais tempo nos armazéns de gelo esculpidos na base da Muralha... mas os prisioneiros não.
“Morrerá aqui, Lorde Snow”, disse Sor Alliser imediatamente antes de fechar a pesada porta de madeira, e Jon tinha acreditado nele. Mas naquela manhã tinham vindo tirá-lo de lá e tinham-no levado, cheio de cãibras e tremendo, à Torre do Rei, para comparecer uma vez mais perante o queixudo Janos Slynt.
– Aquele velho meistre diz que não posso enforcá-lo – declarou Slynt. – Escreveu a Cotter Pyke, e até teve o maldito descaramento de me mostrar a carta. Diz que não é nenhum vira-casaca.
– Aemon viveu tempo demais, senhor – garantiu-lhe Sor Alliser. – Seu discernimento tornou-se tão escuro como os olhos.
– Sim – disse Slynt. – Um cego com uma corrente em volta do pescoço, quem ele pensa que é?
– Mesmo assim – falou Slynt –, não quero que se diga que Janos Slynt enforcou um homem injustamente. Não quero. Decidi dar-lhe uma última chance de demonstrar que é tão leal como diz ser, Lorde Snow. Uma última chance de cumprir o seu dever, sim! – Levantou-se. – Mance Rayder quer parlamentar conosco. Sabe que não tem chances, agora que Janos Slynt chegou, portanto quer conversar, este Rei-para-lá-da-Muralha. Mas o homem é covarde, e não quer vir até nós. Sem dúvida que sabe que o penduraria na forca. Penduraria pelos pés do topo da Muralha, na ponta de uma corda com sessenta metros de comprimento! Mas ele não vem. Pede que lhe mandemos um enviado.
– Vamos mandá-lo, Jon Snow. – Sor Alliser sorriu.
– Eu. – A voz de Jon não tinha vida. – Por que eu?
– Acompanhou estes selvagens – disse Thorne. – Mance Rayder conhece você. Estará mais inclinado a confiar em você.
Aquilo era tão errado que Jon poderia ter rido.
– Entendeu as coisas ao contrário. Mance suspeitou de mim desde o início. Se aparecer em seu acampamento de novo com um manto negro e falando pela Patrulha da Noite, saberá que o traí.
– Ele pediu um enviado, e nós vamos enviar um – disse Slynt. – Se for covarde demais para enfrentar este rei vira-casaca, podemos devolvê-lo à sua cela de gelo. Dessa vez sem as peles, parece-me. Sim.
– Não há necessidade disso, senhor – disse Sor Alliser. – Lorde Snow fará o que pedimos. Ele quer nos mostrar que não é nenhum vira-casaca. Quer mostrar que é um membro leal da Patrulha da Noite.
Jon tinha notado que Thorne era, de longe, o mais inteligente dos dois; aquilo fedia a obra dele por todo o lado. Estava preso numa armadilha.
– Eu vou – disse, numa voz apertada e seca.
– Senhor – lembrou Janos Slynt. – Vai me tratar por...
– Eu vou,
– Um acordo? – Sor Alliser soltou um risinho.
– Janos Slynt não faz acordos com selvagens sem lei, Lorde Snow. Não, não faz.
– Não o estamos enviando para
O vento assobiou por entre as barras, e Jon Snow estremeceu. Tinha a perna latejando e a cabeça também. Não tinha condições de matar um gatinho, mas ali estava.
“Nossa honra não significa mais do que nossas vidas, desde que o reino fique em segurança”, Qhorin Meia-Mão tinha dito nas Presas de Gelo. Precisava se lembrar daquilo. Quer matasse Mance, quer apenas tentasse e falhasse, o povo livre iria matá-lo. Até a deserção era impossível, se estivesse inclinado a tal coisa; para Mance, ele era um mentiroso e traidor comprovado.