Oh, não – estava tão absorta em salvar a Wendy que me esqueci por completo de cancelar o nosso jantar. Como fui capaz de lhe fazer isso outra vez? Sou tão louca pelo Brock. Por que insisto em sabotar a nossa relação?
Às vezes, pergunto-me se estou a fazer de propósito. Para que me deixe agora, antes de eu ter de lhe contar a verdade e me deixar por uma razão que provocará muito mais dor.
– Vá andando – crocito. – Encontro-me consigo lá dentro. Esta não vai ser uma conversa rápida. Ou, talvez, seja muito rápida.
Mal a Wendy sai do carro, atendo a chamada. Como seria de esperar, o Brock parece à beira da fúria.
– Onde estás? Pensava que vinhas cá às sete.
– Hã – digo. – Tive uma mudança de planos.
– Tudo bem. A que hora chegas, então?
Oxalá pudesse dizer que estou mesmo ao virar da esquina, mas a realidade é que estou a horas de distância. E não há uma forma fácil de lho dizer.
– Acho que não vou poder ir esta noite.
– Porque não?
Mais do que tudo, gostaria de lhe poder dizer. Seria um alívio partilhar isto com alguém, mas a Wendy fez-me jurar segredo por uma boa razão.
– Tenho trabalho para fazer. Estudar.
– Estás a falar a sério? – O Brock passou de à beira da fúria para absolutamente encolerizado. – Millie, tínhamos planos para esta noite. E não só não apareceste sem me avisar como agora dás uma desculpa da treta sobre estudar?
Não sei por que não é uma desculpa válida. Podia precisar de estudar esta noite!
– Escuta, Brock...
– Não, escuta tu – rosna. – Tenho sido paciente, mas a minha paciência está a esgotar-se. Preciso de saber o que sentes por mim e aonde vai esta relação. Porque eu estou pronto para algo mais e gostaria de saber que não ando a perder o meu tempo.
O Brock está tão pronto para assentar. Sei que isso se deve em parte ao seu coração fraco, e talvez outra parte seja apenas aquela ânsia indescritível por algo mais que tantas pessoas desenvolvem aos trinta. Não está a brincar. Tenho de o levar a sério ou então de o deixar ir. É o mais correto a fazer.
– Não estás a perder o teu tempo – murmuro para o telemóvel. – Prometo. As coisas estão apenas um pouco
loucas para mim, mas juro que gosto realmente de ti.
– Gostas? Às vezes não tenho a certeza de que isso seja verdade.
Sei o que procura. E sei que tenho duas opções. Ou lhe digo o que quer ouvir ou então tenho de acabar com tudo.
E eu não quero acabar. Embora não sinta o que estou prestes a dizer, o Brock é um homem realmente bom. A vida que imaginei com ele é o que sempre desejei. E não o quero perder.
– Gosto realmente de ti – respiro fundo. – Eu... eu amo-te.
Quase consigo ouvir a combatividade a esvair-se do meu namorado.
– Eu também te amo, Millie. A sério que sim.
– E precisamos realmente de ter uma conversa. – Tenho de lhe contar tudo sobre mim. E em breve. Não aguento ficar à espera do inevitável. Tenho de lhe explicar tudo e de me assegurar de que continua a querer estar comigo. – Assim que as coisas acalmarem, está bem? Na próxima semana.
– Está bem – concorda o Brock, porque tenho basicamente a certeza de que aceitaria o que quer que fosse neste momento. – E, se acabares o teu estudo, talvez possamos jantar amanhã? E passar a noite em minha casa.
Passamos sempre a noite em sua casa. Nem sei porque se deu ao trabalho de deixar uma muda de roupa e um frasco dos seus comprimidos na minha. Mas devo admitir que o seu apartamento é mais agradável e muito mais conveniente.
– Claro.
– Amo-te, Millie.
Oh! Pelos vistos, agora vamos acabar todas as nossas conversas desta forma.
– Eu também te amo.
Desligo a chamada, ainda sem me sentir lá muito bem com a conversa. Ainda tenho o meu namorado, mas por quanto tempo? Diz que me ama, mas às vezes sinto que mal sabe quem eu sou.
Mas talvez vá ficar tudo bem. Talvez descubra a verdade sobre mim e continue a amar-me. E ainda possamos estar juntos, comprar aquela casa nos subúrbios e enchê-la de filhos. Podemos ter uma vida normal e perfeita.
Só que tenho fortes suspeitas de que isso jamais poderá acontecer comigo. Nunca fui normal ou perfeita, e só houve um homem na minha vida que compreendeu isso.
29
Nas melhores circunstâncias, a viagem teria demorado entre três e quatro horas. Com o trânsito, demora quase cinco horas na estrada, com outros trinta minutos somados para quando parámos naquele McDonald’s – valeu a pena para ver a Wendy devorar um hambúrguer de cem gramas e umas batatas fritas médias. Agora, ainda tenho de fazer a viagem de regresso, embora já passe das nove, pelo que as estradas devem ao menos estar livres. De certeza que consigo chegar em menos de três horas.
Ao aproximarmo-nos de Albany, saio da autoestrada numa área de serviço que anuncia um motel. Acontece ser exatamente o que procurávamos – um local de aspeto barato com uma luz tremeluzente a anunciar vagas. Os quartos abrem para o exterior, pelo que a Wendy não terá de atravessar um átrio para lhes chegar. Entro no parque de estacionamento pouco ocupado.
– Bem – digo –, chegámos.