– Bem, à saúde de Sua Graça – gritou alegremente Anguy, o Arqueiro, erguendo a caneca. – Que os Sete protejam o rei!
– Todos os doze que há por aí – resmungou Limo Manto Limão. Bebeu, e limpou a espuma da boca com as costas da mão.
O Marido entrou em grande correria pela porta da frente, com um avental cheio de legumes lavados.
– Há cavalos estranhos nos estábulos – anunciou, como se eles não soubessem.
– Sim – disse Tom, colocando a harpa de lado –, e melhores do que os três que você deu.
O Marido deixou cair os legumes sobre uma mesa, aborrecido.
– Não os dei.
– Não vieram para onde estávamos – disse Limo.
– Bem, eu mandei-os. Vocês deviam estar bêbados, ou dormindo.
– Nós? Bêbados? – Tom bebeu um longo trago de cerveja. – Nunca.
– Podia tê-los pego você mesmo – disse Limo.
– O que, só com o garoto aqui? Já lhes disse duas vezes, a velha estava na Charneca dos Cordeiros ajudando a Fern a parir o bebê. E o mais certo é ter sido um de vocês quem plantou o bastardo na barriga da pobre garota. – Deu a Tom um olhar azedo. – Você, aposto, com essa sua harpa, cantando todas essas canções tristes só para fazer a pobre Fern tirar a roupa de baixo.
– Se uma canção leva uma donzela a querer tirar a roupa e sentir o bom sol quente beijar sua pele, ora, será culpa do cantor? – perguntou Tom. – E, além disso, ela gostava era do Anguy. “Posso tocar o seu arco?”, ouvi Fern perguntando-lhe. “Ooohh, é tão liso, e duro. Acha que eu podia dar uma puxadinha nele?”
O Marido resfolegou.
– Você ou o Anguy, não faz diferença. São tão culpados como eu pelos cavalos. Eram três, sabe? O que pode um homem fazer contra três?
– Três – disse Limo em tom de escárnio –, mas um era mulher e o outro tava acorrentado, foi você mesmo que disse.
O Marido fez uma careta.
– Uma mulher
Anguy exibiu um sorriso por cima da cerveja.
– Quando não gosto dos olhos de um homem, espeto uma flecha num deles.
Arya recordou a flecha que roçara em sua orelha. Queria saber disparar flechas.
O Marido não se mostrou impressionado.
– E você fique calado quando os mais velhos estão conversando. Beba a sua cerveja e segure essa língua, senão mando a velha mostrar-lhe uma colher de pau.
– Os mais velhos falam demais, e não preciso que me diga para beber a minha cerveja. – E deu um grande trago, para mostrar que era assim.
Arya fez o mesmo. Depois de passar dias bebendo de riachos e poças e, depois, do lamacento Tridente, a cerveja tinha um sabor tão bom quanto os golinhos de vinho que o pai costumava deixá-la beber. Começava a vir da cozinha um cheiro que lhe enchia de água a boca, mas seus pensamentos ainda estavam todos naquele barco.
O criado voltou a aparecer com grandes pães redondos. Arya partiu um pedaço, esfomeada, e atirou-se nele. Mas era difícil de mastigar, estava espesso e grumoso, e queimado embaixo.
Torta Quente fez careta assim que o provou.
– Este pão é ruim – disse. – Está queimado, e duro.
– É melhor quando há guisado para mergulhá-lo nele – disse Limo.
– Não é, não – disse Anguy –, mas com guisado é menos provável que quebre um dente.
– Podem comê-lo ou passar fome – disse o Marido. – Tenho cara de ser um maldito padeiro? Gostaria de vê-los fazer melhor.
– Eu conseguiria – disse Torta Quente. – É fácil. Você amassou demais a massa, é por isso que é tão difícil mastigar. – Bebeu outro gole de cerveja e desatou a falar, com gosto, de pães, tortas e empadas, tudo aquilo que adorava. Arya rolou os olhos.
Tom sentou-se diante dela.
– Pombinha – disse ele –, ou Arry, ou seja lá qual for o seu verdadeiro nome, isto é para você. – Pousou um pedaço sujo de pergaminho na mesa de madeira entre ambos.
Ela olhou o pergaminho com desconfiança.
– O que é isso?
– Três dragões de ouro. Precisamos comprar aqueles cavalos.
Arya olhou-o com cautela.
– Os cavalos são
– O que quer dizer é que foi você que os roubou, não é? Não há vergonha nisso, menina. A guerra transforma muita gente honesta em ladrões. – Tom bateu com o dedo no pergaminho dobrado. – Estou lhe pagando um bom preço. Mais do que qualquer cavalo vale, para falar a verdade.
Torta Quente pegou o pergaminho e desdobrou-o.
– Não há ouro nenhum – protestou em voz alta. – Só há coisas escritas.
– Sim – disse Tom –, e lamento por isso. Mas, depois da guerra, pretendemos fazer esse ouro, tem a minha palavra como homem do rei.
Arya afastou-se da mesa e pôs-se em pé.