– Eu não conheço, mas Vermissa está fora do meu setor. Moro em Hobson’s Patch e é aqui que vamos nos despedir. Mas quero lhe dar um conselho antes de nos separarmos. Se você tiver algum problema em Vermissa, vá direto procurar o chefe McGinty. Ele é o chefe da Loja de Vermissa e nada acontece por lá sem que ele queira. Até logo, companheiro. Talvez nos encontremos na Loja uma noite dessas. Não esqueça do que eu disse: se tiver algum problema, vá procurar o Chefe McGinty.
Scanlan desceu e McMurdo ficou novamente entregue aos seus pensamentos. A noite já caíra e as chamas da fornalha rugiam e saltavam com estrépito no meio da escuridão. Com esse fundo sonoro lúgubre, sombras escuras dobravam-se e esticavam-se, retorciam-se e viravam-se, com o movimento das manivelas, ao ritmo de um ruído incessante.
– Acho que o inferno deve ser mais ou menos assim – disse uma voz.
McMurdo virou-se e viu que um dos policiais se ajeitara no banco e olhava a paisagem árida.
– Por isso – disse o outro policial – é que eu acho que o inferno deve ser assim. Se lá embaixo for pior que isso, então é muito pior do que eu imagino. Acho que você é novo por aqui, rapaz.
– Bem, e se eu for? – McMurdo respondeu com rispidez.
– Apenas isso, senhor: deve ter cuidado com os amigos que escolhe. Se eu fosse você, não começaria com Mike Scanlan e sua gangue.
– O que você tem a ver com os meus amigos? – McMurdo disse numa voz tão alterada que todos que estavam no vagão viraram-se para ver o que acontecia. – Eu pedi algum conselho, ou você acha que sou idiota e não sei me virar sem você? Fale apenas quando lhe perguntarem alguma coisa, e, juro por Deus, se dependesse de mim, você ia esperar muito para falar.
Ele encarou o policial e lhe mostrou os dentes como um cão ao rosnar.
Os dois policiais, homens pacatos e de boa índole, ficaram perplexos com a veemência com que seus conselhos bem-intencionados foram rejeitados.
– Não se ofenda, estrangeiro – disse um deles. – Era um aviso para o seu próprio bem, já que você é, como se pode ver, novo por aqui.
– Sou novo por aqui mas não sou novo para você nem para gente do seu tipo – gritou McMurdo, furioso. – Acho que vocês são iguais em todos os lugares, impondo seus conselhos quando ninguém pediu.
– Talvez nos encontremos em breve – disse um dos guardas, sorrindo. – Você foi realmente escolhido a dedo.
– Eu estava pensando a mesma coisa – observou o outro. – Acho que vamos nos encontrar novamente.
– Não tenho medo de vocês, não se enganem – gritou McMurdo. Meu nome é Jack McMurdo, ouviram? Se quiserem me achar, vou ficar na pensão de Jacob Shafter, na Sheridan Street, Vermissa. Não estou me escondendo de vocês, ouviram? Não se enganem quanto a isso.
Houve um murmúrio de simpatia e admiração dos mineiros devido ao comportamento destemido do recém-chegado, enquanto os policiais davam de ombros e voltavam a conversar entre eles. Pouco depois o trem entrava na estação mal-iluminada, surgindo logo a seguir uma grande claridade, pois Vermissa era a maior cidade daquele circuito. McMurdo pegou sua valise de couro e já ia saltar quando um dos mineiros o abordou.
– Puxa, companheiro, você sabe mesmo como falar com os tiras – disse numa voz que denotava admiração. – Foi um prazer ouvi-lo. Deixe-me carregar sua bagagem e lhe mostrar o caminho. Vou passar pela casa de Shafter no caminho para minha casa.
Seguiu-se um coro amistoso de “boa-noite” quando os outros mineiros passaram por eles na plataforma. Antes mesmo de pisar na estação, o violento McMurdo transformara-se numa personalidade em Vermissa.
O campo fora um lugar de terror, mas a cidade era, a seu modo, até mais depressiva. Lá embaixo, ao longo do vale, havia pelo menos um certo esplendor nos gigantescos fornos e nas nuvens de fumaça, enquanto a força e a perseverança do homem encontravam monumentos adequados nas montanhas que ele vasculhara em escavações monstruosas. Mas a cidade tinha um aspecto morto, feio e sórdido. A rua principal, devido ao tráfego, transformara-se numa massa de neve enlameada e marcada pelo sulco das rodas dos veículos. As calçadas eram estreitas e irregulares. O grande número de lâmpadas a óleo servia apenas para mostrar mais nitidamente a série de casas de madeira, cada uma delas com sua varanda dando para a rua, maltratada e suja. Ao se aproximarem do centro da cidade, o cenário clareou devido à existência de uma série de lojas bem-iluminadas, e principalmente por um aglomerado de saloons e casas de jogo, onde os mineiros gastavam seu dinheiro suado mas pago de forma generosa.
– Ali é o sindicato – disse o guia, apontando para um saloon que tinha uma aparência quase tão distinta quanto a de um hotel. – Jack MacGinty é o chefe aí.
– Que tipo de homem ele é? – perguntou McMurdo.
– O quê? Você nunca ouviu falar no chefe?
– Como é que eu poderia ter ouvido falar nele se sou novo aqui?
– Bem, pensei que o nome dele fosse conhecido em todo o país. O nome dele sai sempre nos jornais.
– Por quê?
– Bem... – o mineiro baixou a voz – ... por causa dos negócios.