O chão apanhou-a de surpresa. Tropeçou e caiu, com o coração aos saltos. Quando rolou sobre as costas e fitou o local de onde tinha vindo, sentiu a cabeça a nadar, entontecida, e os dedos agarraram-se à terra.
Sor Dontos ajudou-a a ficar em pé.
– Por aqui. Agora silêncio, silêncio, silêncio. – Permaneceu perto das sombras que se estendiam, negras e espessas, sob os penhascos. Felizmente não tiveram de ir longe. Cinquenta metros a jusante, um homem estava sentado num pequeno esquife, meio escondido pelos restos de uma grande galé que tinha dado à costa ali e queimado. Dontos manqueou até ele, bufando. – Oswell?
– Nada de nomes – disse o homem. – Para o barco. – Estava sentado, curvado sobre os remos, um homem velho, alto e de membros esguios, com longos cabelos brancos, um grande nariz adunco e os olhos escondidos por um capuz. – Entrem, e depressa – resmungou. – Temos de nos pôr a caminho.
Depois de ambos estarem a salvo a bordo, o encapuzado deslizou as pás para dentro de água e entregou as costas aos remos, fazendo o barco avançar para o canal. Por trás deles, os sinos continuavam a repicar a morte do rei rapaz. Tinham o rio escuro todo para si.
Com remadas lentas, constantes e ritmadas, abriram caminho para jusante, deslizando por cima das galés afundadas, passando por mastros partidos, cascos queimados e velas rasgadas. Os toletes tinham sido revestidos, de modo que o barco se movia quase sem um som. Uma névoa pairava sobre a água. Sansa viu o baluarte com ameias de uma das torres do guincho do Duende erguendo-se na margem, mas a grande corrente tinha sido descida e passaram sem impedimentos pelo local onde mil homens tinham ardido. A costa afastou-se, o nevoeiro tornou-se mais denso, o som dos sinos começou a se atenuar. Por fim, mesmo as luzes desapareceram, perdidas em algum lugar atrás deles. Estavam na Baía da Água Negra, e o mundo reduziu-se a água escura, névoa soprada pelo vento e o companheiro silencioso encurvado sobre os remos.
– Temos de ir até muito longe? – ela perguntou.
– Nada de falar. – O remador era velho, mas mais forte do que parecia, e sua voz era feroz. Havia algo estranhamente familiar no rosto dele, embora Sansa não conseguisse identificar o que seria.
– Não é longe. – Sor Dontos tomou sua mão na dele e esfregou-a com gentileza. – Seu amigo está perto, à sua espera.
–
Desconcertada, Sansa mordeu o lábio e encolheu-se em silêncio. O resto foi remar, remar, remar.
O céu do oriente já mostrava o primeiro vago indício da alvorada quando Sansa viu por fim uma silhueta fantasmagórica na escuridão que se estendia adiante; uma galé mercante, com as velas enroladas, deslocando-se lentamente, movida por uma única fileira de remos. Quando se aproximaram, viu a figura de proa do navio, um tritão com uma coroa dourada soprando um grande búzio. Ouviu uma voz gritar, e a galé deu a volta lentamente.
Quando se posicionaram ao lado da galé, uma escada de corda foi atirada por sobre a amurada. O remador puxou os remos para o barco e ajudou Sansa a ficar em pé.
– Agora para cima. Vá lá, menina, eu seguro você. – Sansa agradeceu-lhe pela gentileza, mas só recebeu um grunhido em resposta.
Foi muito mais fácil subir a escada de corda do que tinha sido descer a falésia. O remador Oswell seguiu logo atrás dela, ao passo que Sor Dontos permaneceu no barco.
Dois marinheiros esperavam junto à amurada, para ajudá-la a subir até o convés. Sansa tremia.
– Ela está com frio – ouviu alguém dizer. O homem tirou o manto e aconchegou-o em volta de seus ombros. – Pronto, está melhor, senhora? Descanse, o pior já passou.
Conhecia a voz.
– Lorde Petyr – chamou Dontos do barco. – Tenho de remar de volta, antes que pensem em procurar por mim.
Petyr Baelish pôs uma mão na amurada.
– Mas primeiro vai querer o pagamento. Dez mil dragões, não é?
– Dez mil. – Dontos esfregou a boca com as costas da mão. – Conforme prometeu, senhor.
– Sor Lothor, a recompensa.
Lothor Brune baixou o archote. Três homens aproximaram-se da amurada, ergueram bestas, e dispararam. Um dardo atingiu Dontos no peito quando ele olhou para cima, penetrando através da coroa esquerda de seu sobretudo. Os outros rasgaram a garganta e a barriga. Aconteceu tão depressa que nem Dontos nem Sansa tiveram tempo de gritar. Quando terminou, Lothor Brune atirou o archote para cima do cadáver. O pequeno barco ardia violentamente enquanto a galé se afastava.
–
– Minha senhora – murmurou Mindinho –, seu pesar é desperdiçado num homem como aquele. Era um bêbado, e não era amigo de ninguém.
– Mas ele