Então, a espada de Qhorin caía sobre ele e de algum modo Garralonga saltou para pará-la. A força do impacto quase arrancou a espada bastarda da mão de Jon, e fê-lo cambalear para trás.
Mesmo quando os dentes do Fantasma se fecharam com selvageria em volta da barriga da perna do patrulheiro, de algum modo Qhorin manteve-se de pé. Mas, nesse instante, ao virar-se, surgiu a abertura. Jon firmou-se e girou. O patrulheiro inclinava-se para fora do seu alcance, e por um instante pareceu que o golpe de Jon não o tinha tocado. Então surgiu uma cadeia de lágrimas vermelhas na garganta do grande homem, brilhantes como um colar de rubis, o sangue jorrou, e Qhorin Meia-Mão tombou.
O focinho do Fantasma pingava sangue, mas só a ponta da lâmina bastarda se encontrava manchada, no último centímetro. Jon puxou o lobo gigante para longe do cadáver e ajoelhou com um braço em volta dele. A luz já se desvanecia nos olhos de Qhorin.
– … afiada – ele disse, erguendo os dedos estropiados. Então sua mão caiu, e ele partiu.
– Ponha-o em pé – mãos rudes puxaram-no. Jon não resistiu. – Tem nome?
Ygritte respondeu por ele.
– Chama-se Jon Snow. É do sangue de Eddard Stark, de Winterfell.
Ragwyle soltou uma gargalhada.
– Quem teria imaginado? Qhorin Meia-Mão morto por um filho torto de um fidalguinho qualquer.
– Estripe-o – ordenou Camisa de Chocalho, ainda montado. A águia voou até ele e empoleirou-se em cima do seu elmo ossudo, guinchando.
– Ele se rendeu – Ygritte lembrou-lhes.
– Sim, e matou o irmão – disse um homem baixo e modesto com um meio elmo de ferro carcomido pela ferrugem.
Camisa de Chocalho aproximou-se, com os ossos chocalhando.
– O lobo fez o trabalho por ele. Foi feito porcamente. A morte do Meia-Mão devia ter sido minha.
– Todos vimos como estava se coçando para tratar dela – zombou Ragwyle.
– Ele é um troca-peles – disse o Senhor dos Ossos –, e um corvo. Não gosto dele.
– Pode ser que seja um troca-peles – Ygritte rebateu –, mas isso nunca nos assustou – outros gritaram, concordando. Por trás dos orifícios para os olhos de seu crânio amarelecido, o olhar de Camisa de Chocalho era maligno, mas cedeu de má vontade.
Queimaram Qhorin Meia-Mão onde tinha caído, numa pira feita de agulhas de pinheiro, vegetação rasteira e galhos quebrados. Parte da madeira ainda estava verde, e queimou de forma lenta e fumacenta, fazendo subir uma pluma negra até o brilhante azul profundo do céu. Mais tarde, Camisa de Chocalho reclamou alguns ossos carbonizados, enquanto os outros jogavam dados pelo equipamento do patrulheiro. Ygritte ganhou seu manto.
– Vamos voltar pelo Passo dos Guinchos? – perguntou-lhe Jon. Não sabia se seria capaz de voltar a enfrentar essas altitudes, ou se o garrano sobreviveria a uma segunda travessia.
– Não – ela respondeu. – Não há nada atrás de nós – o olhar que ela lhe lançou era triste. – A essa altura Mance já desceu bastante do curso do Guadeleite, e marcha sobre a sua Muralha.
Bran
As cinzas caíam como uma suave neve cinzenta.
Caminhou por agulhas secas e folhas marrons, até o limite da floresta onde os pinheiros cresciam esparsos. Para lá dos campos abertos, via as grandes pilhas de pedra na forma de homens, hirtas contra o turbilhão das chamas. O vento soprava quente e enriquecido pelo cheiro de sangue e carne queimada, tão forte que começou a salivar.
Mas, ao mesmo tempo que um cheiro os puxava, outros os mantinham afastados. Farejou a fumaça que pairava no ar.