– Digo sim – exclamou o gordo rapaz. Era mais velho do que Jon, legalmente um homem-feito, mas era difícil pensar nele como algo mais que um garoto. – Encontrei desenhos de caras nas árvores, e um livro a respeito da língua dos filhos da floresta… Trabalhos que nem a Cidadela possui, pergaminhos da antiga Valíria, contagens das estações feitas por meistres mortos há mil anos…
– Os livros ainda estarão aqui quando voltarmos.
–
– O Velho Urso vai levar duzentos homens experimentados, e três quartos deles são patrulheiros. Qhorin Halfhand trará mais cem irmãos da Torre Sombria. Estará tão seguro como estava no castelo do senhor seu pai, em Monte Chifre.
Samwell Tarly conseguiu dar um sorrisinho triste.
– Também nunca estive muito seguro, lá, no castelo do meu pai.
– Precisamos de você para os corvos, Sam. E alguém terá de me ajudar a manter Grenn no seu devido lugar.
Os queixos de Sam estremeceram.
– Você poderia cuidar dos corvos, ou Grenn, ou
– Eu sou o intendente do Velho Urso. Terei de ser seu escudeiro, cuidar do seu cavalo, montar sua tenda; não terei tempo para também vigiar pássaros. Sam, você pronunciou as palavras. Agora é um irmão da Patrulha da Noite.
– Um irmão da Patrulha da Noite não deveria estar tão assustado.
– Estamos todos assustados. Seríamos loucos se não estivéssemos.
Muitos patrulheiros tinham se perdido nos últimos dois anos, até Benjen Stark, tio de Jon. Tinham encontrado dois dos homens do tio na floresta, mortos, mas os cadáveres haviam se levantado na noite gelada. Os dedos queimados de Jon se contraíam quando se lembrava daquilo. Ainda via a criatura nos seus sonhos. Othor morto, com seus ardentes olhos azuis e frias mãos negras. Mas esta era a última coisa que ele deveria fazer Sam se lembrar.
– Meu pai ensinou-me que não há vergonha no medo, o que importa é o modo como o enfrentamos. Venha, eu ajudo você a reunir os mapas.
Sam fez um aceno infeliz. As estantes estavam tão próximas umas das outras, que tiveram de sair um atrás do outro. A galeria dava para um dos túneis, que os irmãos chamavam caminhos de minhoca, sinuosas passagens subterrâneas que ligavam as fortalezas e torres de Castelo Negro por baixo da terra. No verão, os caminhos de minhoca raramente eram usados, exceto por ratazanas e outras pragas, mas no inverno era diferente. Quando a neve chegava a dez ou quinze metros de altura, e os ventos gelados uivavam do norte, os túneis eram tudo o que mantinha Castelo Negro em funcionamento.
Os íngremes degraus de pedra deixaram Sam bufando como um fole de ferreiro quando chegaram à superfície. Depararam-se com um vento fresco, que fez o manto de Jon rodopiar e esvoaçar. Fantasma estava adormecido junto à parede de taipa do celeiro, mas acordou quando Jon apareceu, mantendo a felpuda cauda branca rigidamente erguida enquanto trotava na direção deles.
Sam olhou a Muralha de canto de olho. Erguia-se acima das suas cabeças, uma escarpa gelada com duzentos metros de altura. Às vezes, parecia a Jon quase uma coisa viva, dotada de humores próprios. A cor do gelo tinha o costume de mudar a cada alteração da luz. Ora era o azul-profundo, dos rios gelados, ora o branco sujo da neve antiga, e quando uma nuvem passava à frente do sol, escurecia até o cinza-claro de pedra quebrada. A Muralha estendia-se para leste e para oeste, até tão longe quanto o olhar alcançava; tão imensa, que reduzia à insignificância as fortalezas de madeira e torres de pedra do castelo. Era o fim do mundo.
O céu da manhã estava riscado por finas nuvens cinzentas, mas a clara linha vermelha estava lá, por trás delas. Os irmãos negros tinham apelidado o cometa de Archote de Mormont, dizendo (só em parte de brincadeira) que os deuses deviam tê-lo enviado para iluminar o caminho do velho através da floresta assombrada.