– Com Leobald Tallhart e Cley Cerwyn – o jovem senhor fora atingido no olho por uma flecha, e Sor Rodrik perdera o braço esquerdo, do cotovelo para baixo. Meistre Luwin soltou um grito inarticulado de consternação, virou as costas às ameias e caiu de joelhos, vomitando.
– O grande porco Manderly foi covarde demais para sair de Porto Branco, caso contrário também o teríamos trazido – gritou o Elmo Vermelho.
– Abram os portões aos nossos amigos – talvez naquela noite Theon dormisse sem temer o que os sonhos pudessem trazer.
Os homens do Forte do Pavor ultrapassaram o fosso e os portões interiores. Theon desceu com Lorren Negro e Meistre Luwin para recebê-los no pátio. Flâmulas vermelho-claras flutuavam nas extremidades de algumas lanças, mas eram muitos mais os que traziam machados de batalha, espadas longas e escudos meio cortados em lascas.
– Quantos homens perdeu? – perguntou Theon ao Elmo Vermelho enquanto ele desmontava.
– Vinte ou trinta – a luz dos archotes cintilou no esmalte rachado de sua viseira. O elmo e o gorjal tinham sido concebidos para tomar a forma do rosto e dos ombros de um homem, sem pele e ensanguentado, com a boca aberta num silencioso uivo de angústia.
– Sor Rodrik tinha uma vantagem de cinco contra um.
– Sim, mas julgava-nos amigos. Um erro comum. Quando o velho tolo me deu a mão, em vez de pegá-la, cortei metade de seu braço. Depois deixei que visse minha cara – o homem pôs ambas as mãos no elmo e levantou-o de sua cabeça, segurando-o debaixo do braço.
– Fedor – Theon o reconheceu, inquieto.
O homem riu:
– O desgraçado está morto – aproximou-se. – Culpa da moça. Se ela não tivesse fugido para tão longe, o cavalo dele não teria se aleijado e podíamos ter conseguido fugir. Dei-lhe a minha quando vi os cavaleiros do topo da colina. A essa altura já tinha acabado com ela, e ele gostava de ter a sua vez quando ainda estavam quentes. Tive de puxá-lo de cima dela e de meter a minha roupa nas mãos dele… Botas de pele de vitelo e gibão de veludo, cinto de espada gravado em prata, até o meu manto de zibelina. Corra para o Forte do Pavor, eu disse, traga toda a ajuda que conseguir. Leve o meu cavalo, é mais rápido, e tome, use o anel que meu pai me deu, para que eles saibam que vai de minha parte. Ele bem sabia que não era boa ideia questionar-me. Quando espetaram aquela flecha nas costas dele, eu já tinha me besuntado com a porcaria da moça e vestido os farrapos dele. Podiam ter me enforcado mesmo assim, mas foi a única chance que vi – esfregou a boca com as costas da mão. – E agora, meu querido príncipe, houve uma mulher que me foi prometida se lhe trouxesse duzentos homens. Bem, trouxe três vezes mais homens do que isso, e nada de garotos inexperientes ou camponeses, mas sim a própria guarnição de meu pai.
Theon tinha dado sua palavra. Aquela não era hora de vacilar.
– Harrag – disse –, vá aos canis e traga Palla para o…?
– Ramsay – havia um sorriso em seus lábios gordos, mas nenhum naqueles olhos claros. – Minha esposa chamava-me Snow antes de comer os dedos, mas eu digo Bolton – o sorriso coalhou. – Então, oferece-me uma garota dos canis por meus bons serviços, é assim que as coisas são?
Havia um tom na voz dele que não agradou mais a Theon do que o modo insolente como os homens do Forte do Pavor o olhavam.
– Foi ela a prometida.
– Cheira a bosta de cão. Acontece que já tive maus cheiros bastantes. Acho que em vez dela vou ficar com a sua aquecedora de cama. Como se chama? Kyra?
– Está louco? – Theon rebateu, irritado. – Mando…
O tabefe do Bastardo acertou-lhe em cheio, e o malar estilhaçou-se com um nauseante som de trituração sob o aço articulado. O mundo desapareceu num bramido vermelho de dor.
Algum tempo depois, Theon deu por si no chão. Rolou sobre o estômago e engoliu uma golfada de sangue.