– Tem sido um ano ruim para lobos – interveio um homem pálido com seu manto verde manchado pela viagem. – Nas redondezas do Olho de Deus, as matilhas tornaram-se mais ousadas do que se tem registro. Ovelhas, vacas, cães, não importa, matam o que bem quiserem, e não têm medo dos homens. Entrar naqueles bosques durante a noite é arriscar a vida.
– Ah, isso são mais histórias, e são tão pouco reais quanto a outra.
– Eu ouvi o mesmo da minha prima, e ela não é do tipo que mente – disse uma velha. – Diz que há uma grande matilha, com centenas de lobos, matadores de homens. O animal que os lidera é uma loba, uma cadela do sétimo inferno.
O homem do manto verde disse:
– Ouvi falar de como esta cadela do inferno entrou um dia numa aldeia… Um dia de mercado, com gente por todo o lado, e ela entrou, na cara dura, e arrancou um bebê dos braços da mãe. Quando Lorde Mooton ouviu a história, ele e os filhos juraram que acabariam com ela. Seguiram-na até a toca com uma matilha de lobeiros, e foi por pouco que conseguiram salvar a própria pele. Nem um dos cães voltou, nem um.
– Isso é só uma história – Arya exclamou, antes de conseguir se controlar. – Os lobos não comem bebês.
– E o que você sabe disso, moço? – perguntou o homem do manto verde.
Antes que Arya conseguisse pensar numa resposta, Yoren agarrou seu braço.
– O rapaz tem cerveja na cabeça, é só isso.
– Não tenho nada. Eles
– Lá pra fora,
Arya saiu, dura de fúria.
–
– Menino – chamou uma voz amistosa. – Menino adorável.
Um dos homens presos estava falando com ela. Cuidadosamente, Arya aproximou-se da carroça, com uma mão no cabo da Agulha.
O prisioneiro ergueu uma caneca vazia, tilintando as correntes.
– Um homem faria bom proveito de outro gole de cerveja. Um homem tem muita sede quando usa essas pulseiras pesadas.
Era o mais novo dos três, esguio, com traços delicados, sempre a sorrir. Tinha o cabelo vermelho de um lado e branco do outro, todo embaraçado e sujo da cadeia e da viagem.
– Um homem também não se importaria com um banho – ele disse quando viu o modo como Arya o olhava. – Um garoto poderia fazer um amigo.
– Já tenho amigos – ela respondeu.
– Nenhum que eu consiga ver – disse o que não tinha nariz. Era atarracado e troncudo, com umas mãos enormes. Pelos negros cobriam seus braços, pernas, peito e até mesmo as costas. Fazia Arya lembrar-se de um desenho que tinha visto num livro, de um macaco das Ilhas do Verão. O buraco no seu rosto tornava difícil olhá-lo durante muito tempo.
O careca abriu a boca e
– Para com isso! – ela exclamou.
– Um homem não escolhe os companheiros nas celas negras – disse o bonito, com o cabelo vermelho e branco. Qualquer coisa no jeito como falava lembrou-lhe Syrio; era o mesmo, mas ao mesmo tempo diferente. – Estes dois não têm educação. Um homem tem de pedir perdão. Chamam você de Arry, não é verdade?
– Cabeça de Caroço – disse o que não tinha nariz. – Cabeça de Caroço, Cara de Caroço, Rapaz Pau. Toma cuidado, Lorath, que ele bate em você com o pau.
– Um homem tem de sentir vergonha das companhias que tem, Arry – voltou a falar o bonito. – Este homem tem a honra de ser Jaqen H’ghar, antigamente habitante da Cidade Livre de Lorath. Bem que gostaria de estar em casa. Os malcriados companheiros de cativeiro deste homem chamam-se Rorge – indicou com a caneca o homem sem nariz – e Dentadas – Dentadas voltou a
Arya afastou-se da carroça.