– Puxa vida – disse, folheando as páginas –, que coro de gemidos, choros e lamentações! Que punhado de acontecimentos estranhos. Mas, com toda certeza, é um campo valiosíssimo para quem se dedica ao estudo do incomum! O nosso inquilino está sozinho e não pode ser abordado por carta sem a quebra do absoluto segredo desejado. Como as notícias ou mensagens chegam até ele? Claro que através de anúncios em um jornal. Parece não haver outra forma e, felizmente, temos de nos ocupar apenas com um jornal. Aqui estão os recortes do Daily Gazette dos últimos 15 dias. “Senhora com um boá preto no Prince’s Skating Club...”, podemos ir em frente. “Com toda a certeza, Jimmy não vai querer magoar o coração de sua mãe” isto parece não ter importância para nós. “Se a senhora que desmaiou no ônibus de Brixton...”, ela não me interessa. “Todo dia meu coração anseia”, lamentações infindáveis! Ah, isto já é possível. Ouça: “Tenha paciência. Vamos encontrar algum meio de comunicação seguro. Nesse meio-tempo, esta coluna. G.” Isto foi dois dias depois da chegada do inquilino da sra. Warren. Parece plausível, não? O inquilino misterioso pode entender inglês, mesmo que não saiba escrevê-lo. Vamos ver se conseguimos pegar a pista de novo. Sim... sim... aqui está, três dias depois: “Estou tomando providências com êxito. Paciência e prudência. As nuvens hão de passar. G.” Depois disso, uma semana de silêncio. E agora vem algo mais definido: “O caminho está ficando limpo. Se eu achar meio de me comunicar com sinais, lembre-se do código combinado: 1, A; 2, B, e assim por diante. Você logo terá notícias. G.” Isto foi no jornal de ontem,
e hoje não há nada. Tudo se encaixa muito bem no inquilino da sra. Warren. Se esperarmos um pouco, Watson, tenho certeza de que o caso vai ficar ainda mais compreensível.
E assim foi, pois logo de manhã encontrei meu amigo de pé, com as costas voltadas para a lareira e um sorriso de total satisfação nos lábios.
– Que tal isto aqui, Watson? – perguntou, pegando o jornal na mesa. – “Casa vermelha alta com fachada de pedra branca. Terceiro andar. Segunda janela à esquerda. Depois do anoitecer. G.” Isto basta. Acho que, depois do café-da-manhã, devemos fazer um pequeno reconhecimento da vizinhança da sra. Warren. Ah, sra. Warren, que novidades nos traz esta manhã?
Nossa cliente tinha irrompido na sala com tamanho ímpeto que demonstrava que acontecera algo importante.
– É um caso de polícia, sr. Holmes! – berrou ela. – Não quero mais saber disso! Ele tem de sair de lá com a bagagem! Eu ia subir e falar com ele, só que resolvi ouvir primeiro seu conselho. Mas minha paciência está no fim, e quando acontece de baterem no meu marido por causa disso...
– Bateram no seu marido?
– De qualquer forma foi maltratado.
– Mas quem fez isso?
– Ah, isso é o que queremos saber! Foi hoje de manhã, senhor. Meu marido é o controlador do livro de ponto da firma Morton e Waylight’s, em Tottenham Court Road. Ele sai de casa antes das sete horas. Bem, hoje cedo ele ainda não tinha dado dez passos quando dois homens se aproximaram por trás, jogaram um paletó em sua cabeça e o meteram num carro encostado ao meio-fio. Andaram com ele durante uma hora e depois abriram a porta e o jogaram para fora. Ele ficou tão tonto na estrada que nem viu o que aconteceu com o carro. Quando se levantou, viu que estava em Hampstead Heat; tomou um ônibus de volta para casa e está lá, deitado no sofá, enquanto eu vim diretamente lhe contar o que aconteceu.
– Muito interessante – disse Holmes. – Ele notou a aparência dos homens, ouviu-os conversar?
– Não, ele está completamente tonto. Só sabe que foi levantado e atirado como num passe de mágica. Havia pelo menos dois homens, ou talvez três.
– E a senhora relaciona este ataque com seu inquilino?
– Ora, há 15 anos moramos ali e nunca aconteceu uma coisa assim antes. Não quero mais saber dele! Dinheiro não é tudo! Vou fazê-lo sair de minha casa antes de o dia terminar.
– Espere um pouco, sra. Warren. Não faça as coisas de modo precipitado. Começo a achar que este caso é muito mais importante do que pareceu à primeira vista. Está claro agora que algum perigo está ameaçando seu inquilino. Também está claro que os inimigos dele, esperando-o perto de sua casa, pegaram seu marido por engano, na manhã cheia de neblina. Quando perceberam o engano, eles o soltaram. Podemos apenas supor o que fariam se não tivesse sido um engano.
– Bem, o que devo fazer, sr. Holmes?
– Gostaria imensamente de ver seu inquilino, sra. Warren.
– Não sei como se pode conseguir isso, a não ser que o senhor arrombe a porta. Eu sempre o escuto destrancando-a quando desço, depois de deixar a bandeja para ele.
– Ele tem de pegá-la. Com toda a certeza podemos nos esconder e vê-lo.
A mulher pensou por um momento.
– Bem, senhor, há um quarto em frente. Eu posso arrumar um espelho, talvez, e o senhor fica atrás da porta...
– Excelente! Quando ele almoça?
– Ali pelas 13 horas.
– Eu e o dr. Watson estaremos lá, então. Até mais tarde, sra. Warren.