Às 12:30h nós nos achávamos nos degraus da casa da sra. Warren, uma casa alta, de tijolos amarelos, em Great Orme Street, uma ruazinha estreita a noroeste do Museu Britânico. Como fica perto da esquina, tem uma vista da Howe Street, com casas mais elegantes. Com um risinho de satisfação, Holmes apontou para uma das casas, que se destacava das outras.
– Veja, Watson: “Casa vermelha alta com fachada de pedra branca.” É o lugar para os sinais, sem dúvida. Sabemos o lugar e conhecemos o código; de modo que nossa tarefa será simples. Há um cartaz de “Aluga-se” na janela. Evidentemente é um apartamento vazio, ao qual o cúmplice tem acesso. Muito bem, sra. Warren, e agora?
– Está tudo preparado para os senhores. Se subirem agora e deixarem os sapatos aqui, eu os instalarei lá.
Ela arranjara um excelente esconderijo. O espelho fora colocado de tal forma que, sentados no escuro, podíamos ver toda a porta em frente. Mal tínhamos nos instalado, depois que a mulher saiu, quando ouvimos uma campainha tocando, o que significava que o misterioso hóspede tinha chamado. Naquele momento a senhoria apareceu com a bandeja, colocou-a sobre a cadeira, perto da porta fechada e foi-se embora, pisando forte. Espremidos no ângulo da porta, ficamos olhando para o espelho. De repente, depois que os passos da mulher desapareceram, ouvimos uma chave rangendo na porta, a maçaneta se mexeu e duas mãos finas apareceram e pegaram o prato da cadeira. Mas logo em seguida as mesmas mãos largaram o prato na cadeira e eu vi, rapidamente, um rosto bonito, moreno e aterrorizado olhando para a estreita abertura da nossa porta. Ele bateu a porta rapidamente, trancou-a e tudo ficou em silêncio. Holmes puxou-me pela manga e descemos silenciosamente a escada.
– Voltarei à noite – ele disse à mulher ansiosa. – Acho que nós podemos analisar melhor o caso em nossos aposentos, Watson.
– Minha suposição, como você viu, estava correta – disse Holmes, sentado em sua poltrona. Houve uma substituição de inquilinos. O que não previ, Watson, era que encontraríamos uma mulher, e não se trata de uma mulher comum.
– Ela nos viu.
– Bem, ela viu algo que a assustou. Isto é evidente. A seqüência geral dos acontecimentos está bastante clara, não? Um casal procura refúgio em Londres por causa de um perigo terrível e iminente. O tamanho desse perigo pode ser medido pelo rigor das precauções. O homem, que tem um trabalho qualquer a fazer, precisa deixar a mulher em absoluta segurança enquanto ele age. Não é um problema fácil, mas ele resolveu de forma original e de maneira tão eficaz que nem a dona da pensão, que lhe leva as refeições, sabe de sua presença. Os bilhetes, em letra de fôrma, são uma maneira de evitar que descobrissem o sexo dela pela caligrafia. O homem não pode aproximar-se da mulher; do contrário levará até ela os inimigos. Como não pode comunicar-se diretamente com ela, recorreu à seção de anúncios de um jornal. Até aqui, está tudo muito claro.
– Mas qual o motivo disso tudo?
– Ah, sim, Watson, extremamente prático, como sempre! Qual o motivo disso tudo? O extravagante problema da senhora Warren aumenta um pouco e assume um aspecto ainda mais sinistro quando continuamos. Até aqui podemos dizer o seguinte: esta não é uma fuga comum de amor. Você viu o rosto da mulher ao sinal de perigo. Ficamos sabendo, também, que o ataque ao marido da sra. Warren sem dúvida nenhuma era dirigido ao inquilino. Estes alarmes e a desesperada necessidade de segredo, tudo indica ser um caso de vida ou morte. O ataque ao sr. Warren mostra ainda que o inimigo, quem quer que seja, também não está a par da substituição do inquilino. Muito interessante e complexo, Watson.
– Por que você continua? O que tem a ganhar com isso?
– Sim, o quê? É pelo amor à arte, Watson. Acho que você, quando se formou em medicina, muitas vezes cuidou de doenças sem pensar em pagamento, não?
– Enriquecimento de meus conhecimentos, Holmes.
– Essa formação não acaba nunca, Watson. É uma seqüência de lições, a seguinte ainda mais interessante. Aqui nós temos um caso instrutivo. Não há nem dinheiro nem mérito nele, mas mesmo assim a gente quer esclarecê-lo. Quando anoitecer, estaremos num estágio mais avançado de nossas investigações.
Ao voltarmos à casa da sra. Warren, a tristeza da noite de inverno de Londres se transformara numa espessa neblina cinza, envolvendo tudo na monotonia de sua cor, quebrada somente pelos retângulos amarelos e vivos das janelas iluminadas. Olhando pela janela, já dentro da casa, vimos uma luz mais tênue brilhando no alto, na escuridão da noite.