Mas, ao contrário do que ele pensara, o jogo ainda não tinha terminado. Havia outra rodada a ser jogada, e talvez mais outra e mais outra ainda. Ted Baldwin escapara do cadafalso; e os Willabys também; e o mesmo aconteceu com vários dos mais violentos membros da quadrilha. Durante dez anos eles ficaram fora do mundo, e então chegou um dia em que ficaram livres novamente – um dia que Edwards, que conhecia bem esses homens, sabia ser o fim da sua vida tranqüila. Eles haviam jurado que derramariam o sangue dele como vingança pelos seus companheiros. E partiram imediatamente para cumprir a promessa. Ele teve de fugir de Chicago depois de dois atentados que quase foram fatais. A partir daí ficou bem claro que o terceiro não falharia. De Chicago ele partiu, já com o nome trocado, para a Califórnia, e foi lá que sua vida por um certo tempo perdeu o encanto, quando Ettie Edwards morreu. Mais uma vez ele quase foi morto, e mais uma vez, com o nome de Douglas, trabalhou num vale isolado onde, com um sócio inglês chamado Barker, enriqueceu. Por fim chegou um aviso de que seus perseguidores estavam na sua pista novamente e ele partiu – na hora certa – para a Inglaterra. E daí surgiu John Douglas, que pela segunda vez se casou com uma companheira digna e que viveu durante cinco anos como um proprietário rural em Sussex – uma vida que terminou com os estranhos acontecimentos de que tomamos conhecimento.
Epílogo
Os procedimentos policiais e legais haviam terminado e o caso de John Douglas foi enviado a uma instância superior do Judiciário. Então ele foi absolvido por ter agido em legítima defesa. “Leve-o para fora da Inglaterra a qualquer custo”, Holmes escrevera à esposa dele. “Há certas forças aqui que podem ser mais perigosas do que aquelas das quais ele escapou. Não há segurança para o seu marido na Inglaterra.”
Dois meses se passaram e o caso, até certo ponto, havia se apagado de nossa lembrança. Então, certa manhã, chegou um bilhete enigmático que fora colocado em nossa caixa do correio. “Valha-me Deus, sr. Holmes! Valha-me Deus!”, dizia aquela carta incomum. Não havia nem sobrescrito nem assinatura. Eu ri ao ver aquela mensagem estranha, mas Holmes mostrou uma seriedade maior que a habitual.
– Que estranho, Watson! – ele disse, e ficou sentado durante muito tempo com a testa franzida.
Mais tarde, naquela mesma noite, a sra. Hudson, nossa senhoria, trouxe o recado de um cavalheiro que desejava ver Holmes dizendo que o assunto era muito importante. Logo atrás da portadora de sua mensagem entrou o sr. Cecil Barker, nosso amigo da Casa Senhorial. Seu rosto estava desfigurado.
– Tenho más notícias. Terríveis mesmo, sr. Holmes – ele disse.
– Eu temia que fosse isso – disse Holmes.
– O senhor não recebeu nenhum telegrama, recebeu?
– Recebi um bilhete que parecia um telegrama.
– É o coitado do Douglas. Dizem que o nome dele é Edwards, mas para mim ele será sempre o Jack Douglas, de Benito Canyon. Eu já lhe disse que eles partiram para a África do Sul no Palmyra, há três semanas.
– Exatamente.
– O navio chegou à Cidade do Cabo ontem à noite. Recebi este telegrama da sra. Douglas hoje de manhã:
Jack caiu no mar durante ventania costas Sta. Helena. Ninguém sabe como acidente ocorreu. – lvy Douglas
– Ah, foi assim, é? – disse Holmes, pensativo. – Bem, não tenho dúvida de que foi tudo bem preparado.
– O senhor quer dizer que não foi acidente?
– Claro que não foi.
– Ele foi assassinado?
– Certamente!
– Eu também penso assim. Esses diabólicos Scowrers, esses malditos criminosos vingativos...
– Não, não, meu senhor – disse Holmes. – Há um toque de mestre aqui. Não é um simples caso de espingarda de cano serrado e de revólveres baratos. Pode-se reconhecer um mestre pelos requintes. Conheço muito bem quando Moriarty põe o seu dedo num caso. Esse crime é de Londres e não da América.
– Mas por quê?
– Porque foi feito por um homem que não pode falhar: uma pessoa cuja posição depende do fato de que tudo que faz deve dar certo. Um cérebro privilegiado e uma grande organização foram utilizados para a eliminação de um homem. É quebrar uma noz com o martelo. Uma extravagância, mas de qualquer modo a noz fica esmagada.
– O que esse tal homem tem a ver com tudo isso?
– Só posso dizer que a primeira notícia que chegou a nós foi por intermédio de um dos homens dele. Esses americanos foram bem aconselhados. Tendo um serviço a ser feito aqui, pediram a participação, como qualquer criminoso estrangeiro faria, desse grande consultor de crimes. A partir desse instante a vítima está condenada. A princípio ele se contentaria em usar sua máquina para localizar a vítima dos americanos. Depois indicaria como o caso poderia ser tratado. Finalmente, quando soubesse das falhas do agente enviado, ele próprio entraria no caso com o seu toque de mestre. O senhor ouviu quando eu avisei ao seu amigo que o perigo futuro seria maior do que o perigo passado. Eu estava certo?
Barker bateu com a mão fechada na testa, demonstrando a impotência de sua raiva.