Já havia, na verdade, um policial atrás dele, mas o incidente, por sorte, fez-lhe mais bem do que mal. Depois do primeiro encontro, eram raras as noites em que não ia ao saloon de McGinty, a fim de se entrosar melhor com “os rapazes”, que era o título jovial pelo qual a perigosa quadrilha que infestava o lugar era conhecida entre seus integrantes. Seu jeito impetuoso e destemido de falar fez dele um favorito entre o grupo, enquanto que o modo rápido e científico pelo qual eliminava seus antagonistas numa disputa de bar fez com que conquistasse o respeito daquela comunidade rude. Mas um outro incidente fez com que os outros o estimassem ainda mais.
Uma noite, na hora de maior movimento, a porta do saloon se abriu e entrou um homem trajando o uniforme azul da polícia das minas de carvão e ferro. Era uma corporação especial criada pelos proprietários das minas e das ferrovias a fim de ajudar os efetivos da polícia civil, que não tinham condições de combater o banditismo que aterrorizava a região. Houve um silêncio quando o homem entrou, e muitos o olharam com curiosidade, mas as relações entre policiais e criminosos são especiais em algumas regiões dos Estados Unidos, e o próprio McGinty, que estava atrás do balcão, não se mostrou surpreso quando o inspetor se misturou aos seus clientes.
– Um uísque puro, porque a noite está fria – disse o oficial. – Acho que não nos encontramos antes, conselheiro.
– O senhor será o novo comandante? – perguntou McGinty.
– Exatamente. Confiamos no senhor, conselheiro, e em outros cidadãos de destaque para nos ajudar a manter a lei e a ordem nesta cidade. Meu nome é capitão Marvin, da polícia das minas.
– Ficaríamos melhor sem o senhor, capitão Marvin – disse McGinty secamente. – Porque temos a polícia da cidade e não precisamos de coisas importadas. As pessoas da sua corporação são instrumentos pagos pelos homens de dinheiro, contratados por eles para bater ou atirar nas pessoas mais pobres, não é?
– Bem, não vamos discutir sobre isso – disse o policial de bom humor. – Acho que cada um faz seu trabalho, mas não podemos ter a mesma opinião sobre ele. – Ele esvaziou seu copo e virou-se para sair quando seus olhos bateram no rosto de Jack McMurdo, que estava apoiado com cotovelo no balcão. – Olá! – ele gritou, olhando o outro de cima a baixo. – Aqui está um velho conhecido.
McMurdo afastou-se dele.
– Nunca fui seu amigo nem de nenhum outro maldito policial em toda a minha vida – disse ele.
– Ser conhecido não significa ser amigo – disse o policial, sorrindo. Você é Jack McMurdo, de Chicago, tenho certeza, e não tente negar.
McMurdo deu de ombros.
– Não estou negando nada – disse ele. – Acha que tenho vergonha do meu nome?
– Você tem bons motivos para isso.
– Que diabo você quer dizer com isso? – ele gritou, fechando os punhos.
– Não, não, Jack. Gritos não adiantam comigo. Eu era oficial em Chicago antes de vir para esse maldito depósito de carvão, e reconheço logo um criminoso de Chicago quando ponho os olhos nele.
O rosto de McMurdo mostrou espanto.
– Não me diga que você é o Marvin da Central de Chicago! – ele gritou.
– O mesmo Teddy Marvin, às suas ordens. Não esquecemos do assassinato de Jonas Pinto lá.
– Eu não o matei.
– Não? Que testemunho imparcial, não acha? Bem, você fez a coisa de modo notável, do contrário eles o teriam agarrado. Mas vamos deixar de lado essas coisas do passado porque, aqui entre nós (e talvez eu esteja me excedendo ao dizer isso), eles não têm como acusá-lo de nada, e Chicago o espera de braços abertos.
– Estou muito bem onde estou.
– Bem, eu lhe ofereci a sugestão e você é mal-humorado demais para me agradecer.
– É, acho que você tem razão, e realmente lhe agradeço – disse McMurdo, de um modo não muito amável.
– Pra mim está tudo bem, desde que você esteja andando dentro da lei – disse o capitão. – Mas se sair da linha, aí é outra coisa! Então, boa-noite pra você. E boa-noite, conselheiro.
Ele deixou o saloon, mas não sem antes criar um herói ali. O passado de McMurdo em Chicago já fora comentado antes. Ele desestimulara todas as perguntas com um sorriso, como alguém que não desejasse ser enaltecido por seus feitos. Mas agora a coisa toda estava oficialmente confirmada. Os freqüentadores do bar o rodearam e cumprimentaram com entusiasmo, apertando sua mão. Ele estava livre da comunidade a partir de então. Ele conseguia beber muito sem demonstrar embriaguez, mas naquela noite, se seu amigo Scanlan não estivesse por perto para levá-lo para casa, o grande herói certamente teria passado a noite debaixo do balcão.