– O senhor não tem o direito de fazer uma pergunta dessas! – ele gritou. – O que isso tem a ver com o caso que o senhor está investigando?
– Vou repetir a pergunta.
– Recuso-me a responder.
– O senhor pode se recusar a responder, mas deve saber que sua recusa já é uma resposta, pois o senhor não se recusaria a responder se não tivesse nada a esconder.
Barker ficou imóvel por um momento, com o rosto contraído, perdido em reflexões. Depois ergueu os olhos, sorrindo.
– Bem, acho que os senhores estão fazendo apenas seu serviço, afinal de contas, e não tenho o direito de dificultar as coisas. Só pediria que os senhores não preocupassem a sra. Douglas com esse assunto, pois tudo o que houve já é demais. Posso dizer-lhes que o pobre do Jack só tinha um defeito na vida, e esse defeito era o ciúme. Ele gostava muito de mim – ninguém poderia gostar mais de um amigo. E era dedicado à sua esposa. Ele gostava que eu viesse aqui e estava sempre mandando me chamar. Mesmo assim, se a esposa dele e eu conversássemos ou se ele notasse alguma simpatia entre nós, era dominado por uma onda de ciúme e perdia a cabeça, dizendo as piores coisas do mundo. Mais de uma vez eu jurei nunca mais vir aqui por este motivo, mas então ele me enviava cartas arrependidas, suplicantes, dizendo que eu precisava vir. Mas podem acreditar em mim, senhores, que nenhum homem jamais teve uma esposa mais adorável e fiel. E lhes digo também: nenhum amigo jamais foi mais leal do que eu.
Isso foi dito de modo veemente e emocionado, mas mesmo assim o inspetor MacDonald não pôde encerrar o assunto.
– O senhor sabe – ele disse – que a aliança do morto foi tirada de seu dedo?
– É o que parece – disse Barker.
– O que o senhor quer dizer com “parece”? O senhor sabe que isso é um fato.
O homem pareceu confuso e hesitante.
– Quando eu disse “parece”, quis dizer que era possível que ele mesmo tivesse tirado a aliança.
– O simples fato de a aliança ter sumido, independentemente de quem a tirou do dedo, pode sugerir a qualquer um que o casamento e a tragédia têm ligação. Ou será que não?
Barker sacudiu seus ombros largos.
– Não posso afirmar o que isso sugere – ele respondeu. – Mas se o senhor quer dar a entender que isso poderia se refletir de algum modo no comportamento desta senhora – seus olhos chamejaram por um instante e depois, com um esforço evidente, ele controlou suas emoções – bem, o senhor está no caminho errado, é o que penso.
– Acho que não tenho mais nada para lhe perguntar, por enquanto – disse MacDonald em tom seco.
– Há um pequeno detalhe – disse Sherlock Holmes. – Quando o senhor entrou no escritório havia apenas uma vela acesa na mesa, não é?
– Sim, é isso mesmo.
– Apenas com a luz dessa vela o senhor viu que algo de terrível havia acontecido?
– Exatamente.
– O senhor imediatamente tocou a campainha para pedir ajuda?
– Sim.
– E essa ajuda chegou logo?
– Em cerca de um minuto.
– No entanto, quando os outros chegaram, a vela já estava apagada e a lâmpada acesa. Isso parece notável.
Novamente Barker mostrou sinais de indecisão.
– Não vejo o que isso tem de notável, sr. Holmes – ele respondeu depois de uma pausa. – A vela tem uma luz muito fraca. Minha primeira idéia foi ter uma iluminação melhor. O abajur estava na mesa, e então eu o acendi.
Holmes não perguntou mais nada e Barker, olhando alternadamente para cada um de nós, com um jeito que me pareceu desafiador, virou-se e saiu da sala.
O inspetor MacDonald enviara um recado à sra. Douglas dizendo que aguardaria por ela em seu quarto, mas ela respondeu que nos encontraria na sala de jantar. Ela entrou na sala finalmente, uma mulher alta e bonita com cerca de 30 anos, reservada e controlada, muito diferente da figura trágica e confusa que eu imaginara. É bem verdade que seu rosto estava pálido e com um ar cansado, demonstrando ter sofrido um grande choque, mas seus modos eram tranqüilos e suas mãos bem desenhadas, que ela pôs sobre a mesa, estavam tão firmes quanto as minhas. Seus olhos tristes e atraentes olhavam para cada um de nós de um jeito curiosamente inquisitivo. Aquela expressão interrogativa transformou-se repentinamente em palavras.
– Os senhores descobriram alguma coisa? – ela perguntou.
Seria apenas fruto da minha imaginação achar que havia um indício de medo, em vez de esperança, naquela pergunta?
– Tomamos todas as providências possíveis, sra. Douglas – disse o inspetor. – A senhora pode ter certeza de que nada será negligenciado.
– Não economize dinheiro – ela disse num tom de voz desanimado, monocórdio. – Meu desejo é que sejam feitos todos os esforços.
– Talvez a senhora possa nos dizer algo que esclareça o problema.
– Não se preocupe, tudo que eu sei contarei aos senhores.
– Soubemos pelo sr. Cecil Barker que a senhora na verdade não viu... Que a senhora não entrou no cômodo onde ocorreu a tragédia.
– É verdade. Ele fez com que eu voltasse lá para cima. Pediu que eu voltasse para o meu quarto.
– Exatamente. A senhora tinha ouvido o tiro e desceu imediatamente.
– Vesti meu roupão e desci.