«Estava estabelecido que, no verdadeiro anarquismo, cada um tem que, por suas pr'oprias forcas, criar liberdade e combater as ficc~oes sociais. Pois por minhas pr'oprias forcas eu ia criar liberdade e combater as ficc~oes sociais. Ningu'em queria seguir-me no verdadeiro caminho anarquista? Seguiria
Suspendeu um pouco o discurso, que se lhe tornara quente e fluido. Retomou-o dali a pouco, com a voz j'a mais sossegada.
— 'E um estado de guerra, pensei eu, entre mim e as ficc~oes sociais. Muito bem. O que posso eu fazer contra as ficc~oes sociais? Trabalho sozinho, para n~ao poder, de modo nenhum, criar qualquer tirania. Como posso eu colaborar sozinho na preparac~ao da revoluc~ao social, na preparac~ao da humanidade para a sociedade livre? Tenho que escolher um de dois processos, dos dois processos que h'a; caso, 'e claro, n~ao possa servir-me de ambos. Os dois processos s~ao a acc~ao indirecta, isto 'e, a propaganda, e a acc~ao directa, de qualquer esp'ecie.
«Pensei primeiro na acc~ao indirecta, isto 'e, na propaganda. Que propaganda poderia eu fazer s'o por mim? `A parte esta propaganda que sempre se vai fazendo em conversa, com este ou aquele, ao acaso e servindo-nos de todas as oportunidades, o que eu quer'ia saber era se a acc~ao indirecta era um caminho por onde eu pudesse encaminhar a minha actividade de anarquista energicamente, isto 'e, de modo a produzir resultados sens'iveis. Vi logo que n~ao podia ser. N~ao sou orador e n~ao sou escritor. Quero dizer: sou capaz de falar em p'ublico, se for preciso, e sou capaz de escrever um artigo de jornal; mas o que eu queria averiguar era se o meu feitio natural indicava que, especializando-me na acc~ao indirecta, de qualquer das duas esp'ecies ou em ambas, eu poderia obter resultados
«Tinha eu pois que aplicar `a vida pr'atica o processo fundamental de acc~ao anarquista que eu j'a tinha esclarecido — combater as ficc~oes sociais sem criar tirania nova, criando j'a, caso fosse poss'ivel, qualquer coisa da liberdade futura. Ora como diabo se faz isso na pr'atica?