– São escolhidos ainda jovens, pelo tamanho, rapidez e força – disse-lhe a escrava. – Iniciam o treinamento aos cinco anos. Treinam todos os dias, da alvorada ao pôr do sol, até dominarem a espada curta, o escudo e as três lanças. O treino é muito rigoroso, Vossa Graça. Só um garoto em três sobrevive a ele. Isso todos sabem. Entre os Imaculados diz-se que no dia em que ganham seu capacete de espigão o pior ficou para trás, pois nenhum dever que for atribuído a eles poderá ser tão duro quanto o treinamento.
Kraznys mo Nakloz, supostamente, não falava o Idioma Comum, mas balançava a cabeça enquanto escutava e de vez em quando empurrava a escrava com a ponta do chicote.
– Diga-lhe que aqueles estão ali em pé há um dia e uma noite, sem comida nem água. Diga-lhe que ficarão ali até caírem se eu lhes ordenar que o façam, e que quando novecentos e noventa e nove tiverem caído e morrido sobre os tijolos, o último ainda estará ali e não se moverá até que a própria morte o reclame. É assim a coragem deles. Diga-lhe isso.
– Eu chamo isso de loucura, não de coragem – disse Arstan Barba-Branca quando a solene pequena escriba terminou. Bateu com a ponta de seu bastão de madeira nos tijolos,
– O que disse o velho fedorento? – perguntou o feitor à tradutora. Quando ela lhe disse, ele sorriu e falou: – Informe os selvagens de que chamamos isso de
– As ovelhas são obedientes – disse Arstan quando as palavras foram traduzidas. Ele também sabia algum valiriano, embora não tanto quanto Dany, mas, assim como ela, fingia ignorância.
Kraznys mo Nakloz mostrou seus grandes dentes brancos quando aquilo lhe foi transmitido.
– Uma palavra minha e aquelas ovelhas derramam as velhas tripas fedorentas dele nos tijolos – disse ele –, mas não lhe diga isso. Diga-lhes que estas criaturas são mais cães do que ovelhas. Eles comem cão ou cavalo lá nos Sete Reinos?
– Preferem porcos e vacas, excelência.
– Carne de vaca. Pfuá. Comida para selvagens que não se lavam.
Ignorando-os, Dany percorreu lentamente a fileira de soldados escravos. As mulheres seguiram-na de perto com o toldo de seda, para mantê-la à sombra, mas os mil homens à sua frente não desfrutavam de tal proteção. Mais da metade possuía pele acobreada e olhos amendoados dos dothraki e dos lhazarenos, mas Dany também viu nas fileiras homens das Cidades Livres, bem como qarthenos de pele clara, ilhéus de verão com rosto de ébano, e outros cuja origem não era capaz de adivinhar. E alguns tinham pele do mesmo tom de âmbar de Kraznys mo Nakloz, e os cabelos rijos vermelhos e negros que identificavam o antigo povo de Ghis, aqueles que chamavam a si mesmos de filhos da harpia.
Alguns dos soldados eram altos e outros, baixos. Dany calculou que as idades oscilariam entre os catorze e os vinte anos. Os rostos eram lisos, e os olhos todos iguais, fossem negros, castanhos, azuis, cinza ou ambarinos.
– Por que os cortam? – perguntou a Kraznys através da escrava. – Sempre ouvi dizer que homens inteiros são mais fortes do que eunucos.
– Um eunuco cortado ainda novo nunca terá a força bruta de um de seus cavaleiros westerosi, é verdade – disse Kraznys mo Nakloz quando a pergunta lhe foi colocada. – Um touro também é forte, mas touros morrem todos os dias nas arenas de luta. Uma menina de nove anos matou um há três dias na Arena de Jothiel. Os Imaculados têm algo melhor do que a força, diga-lhe. Têm disciplina. Lutamos à maneira do Velho Império, sim. São as legiões marchantes da Velha Ghis regressadas, absolutamente obedientes, absolutamente leais, e totalmente desprovidas de medo.
Dany escutou pacientemente a tradução.
– Até os homens mais corajosos temem a morte e a mutilação – disse Arstan quando a garota terminou.