– A coisa no céu é um cometa, minha doce menina. Uma estrela com uma cauda, perdida nos céus. Desaparecerá em breve, para não voltar a ser vista enquanto estivermos vivos. Espere e verá.
Shireen fez um pequeno, mas corajoso aceno com a cabeça.
– A mãe diz que o corvo branco quer dizer que já não é verão.
– É verdade, senhora. Os corvos brancos só voam da Cidadela.
Os dedos de Cressen alcançaram a corrente que rodeava seu pescoço; cada um de seus elos havia sido forjado com um metal diferente, cada um simbolizando o seu domínio de mais um ramo do conhecimento; o colar de meistre, a marca da sua ordem. No orgulho da juventude, usara-o com facilidade, mas agora parecia-lhe pesado, e o metal era frio no contato com sua pele.
– São maiores do que os outros corvos, mais inteligentes, e criados apenas para transportar as mensagens mais importantes. Este veio nos dizer que o Conclave se reuniu, avaliou os relatórios e as medições feitas pelos meistres de todo o reino e declarou que este longo verão finalmente terminou. Durou dez anos, duas rotações e dezesseis dias, o mais longo verão já registrado.
– Agora vai ficar frio?
Shireen era uma criança do verão, e nunca tinha experimentado o verdadeiro frio.
– A seu tempo – Cressen respondeu. – Se os deuses forem bondosos, oferecerão um Outono quente e colheitas abundantes para que possamos nos preparar para o inverno que virá depois – o povo dizia que um verão longo significava um inverno ainda mais longo, mas o meistre não tinha por que assustar a criança com histórias como essa.
Cara-Malhada fez soar seus guizos.
– É
Shireen soltou um risinho.
– Eu gostaria de ter um vestido de algas prateadas.
– Debaixo do mar, neva para cima – disse o bobo –, e a chuva é seca como um osso. Eu sei, eu sei, ei, ei, ei.
– Vai mesmo nevar? – ela perguntou.
– Vai – Cressen confirmou.
Shireen soltou um grito de alegria. Até Cressen tinha de admitir que a ave era impressionante, branca como a neve e maior do que qualquer falcão, com os brilhantes olhos negros que significavam não se tratar de uma ave albina, mas sim de um corvo branco puro-sangue da Cidadela.
– Aqui – chamou o meistre. O corvo abriu as asas, deu um salto e bateu-as ruidosamente pela sala até pousar na mesa ao lado dele.
– Vou agora tratar do seu café da manhã – Pylos anunciou, e Cressen anuiu com a cabeça.
– Esta é a Senhora Shireen – disse ao corvo. A ave balançou a cabeça para cima e para baixo, como se a estivesse reverenciando.
A criança ficou de queixo caído.
– Ele
– Algumas palavras. Como eu disse, estas aves são espertas.
– Ave esperta, homem esperto, bobo esperto, esperto – cantarolou Cara-Malhada com uma voz desagradável. – Oh, bobo esperto, esperto, esperto – e começou a cantar: –
Inclinava a cabeça a cada palavra, fazendo ressoar os guizos presos aos chifres.
O corvo branco soltou um grito e voou para longe, indo empoleirar-se no corrimão de ferro das escadas do viveiro. Shireen pareceu encolher-se.
– Ele canta isso o tempo todo. Disse-lhe para parar, mas ele não para. Ele me assusta. Faça-o parar.