Читаем A Fúria dos Reis полностью

O meistre encontrou os cristais onde os tinha deixado e os recolheu de cima do pergaminho. Cressen não tinha anéis ocos, daqueles que se dizia que os envenenadores de Lys preferiam, mas uma miríade de bolsos, grandes e pequenos, tinham sido costurados do lado de dentro das grandes mangas da sua toga. Escondeu as sementes de estrangulador num deles, escancarou a porta e chamou:

– Pylos? Onde está você? – diante da falta de resposta, voltou a chamar, mais alto: – Pylos, preciso de ajuda.

Continuou a não haver resposta. Era estranho; a cela do jovem meistre ficava apenas meia-volta da escada abaixo, bem ao alcance da sua voz. Por fim, Cressen foi forçado a chamar os criados.

– Apressem-se – disse-lhes. – Dormi demais. A esta altura já estão no banquete… bebendo… Deviam ter me acordado – que teria acontecido ao Meistre Pylos? Realmente não compreendia.

De novo teve de atravessar a longa galeria. Um vento noturno sussurrava através das grandes janelas, trazendo o cheiro vivo do mar. Tochas tremeluziam ao longo das muralhas de Pedra do Dragão, e no acampamento, que se estendia para lá delas, era possível ver centenas de fogueiras de cozinhar ardendo, como se um campo de estrelas tivesse caído sobre a terra. No alto, o cometa brilhava, vermelho e malévolo. Sou velho e sábio demais para temer esse tipo de coisa, disse o meistre para si mesmo.

As portas que abriam para o Grande Salão ficavam na boca de um dragão de pedra. Disse aos criados para que o deixassem do lado de fora. Seria melhor entrar sozinho; não devia aparentar fraqueza. Apoiando-se pesadamente na bengala, Cressen subiu os últimos degraus e coxeou por baixo dos dentes da entrada. Um par de guardas abriu as pesadas portas vermelhas à sua frente, libertando uma súbita explosão de som e de luz. Cressen penetrou no estômago do dragão.

Por sobre o tinir de facas e pratos, e o profundo burburinho das conversas de mesa, ouviu Cara-Malhada cantando “… dançar, senhor, dançar, senhor”, acompanhado por guizos dissonantes. A mesma canção horrível que cantara de manhã. “As sombras vêm ficar, senhor, ficar, senhor, ficar, senhor.” As mesas inferiores estavam apinhadas de cavaleiros, arqueiros e capitães mercenários, que desfaziam nacos de pão preto para ensopar nos seus guisados de peixe. Ali não havia risos sonoros nem gritos obscenos, como os que acabavam com a dignidade dos banquetes de outros homens, Lorde Stannis não permitia tais coisas.

Cressen abriu caminho na direção da plataforma elevada onde os senhores se sentavam com o rei. Teve de fazer um desvio em volta de Cara-Malhada. Dançando, com os guizos tocando, o bobo não o viu nem ouviu seus passos. Enquanto saltitava de uma perna para outra, guinou sobre Cressen, chutando a bengala em que o meistre se apoiava. No meio da afobação, caíram juntos, num emaranhado de braços e pernas, enquanto uma súbita explosão de risos se ergueu à volta deles. Não havia dúvida de que o espetáculo era cômico.

Cara-Malhada estatelou-se meio por cima do meistre, com a sua cara tatuada de bobo comprimida contra a de Cressen. Tinha perdido o elmo de latão com chifres e guizos.

– Debaixo do mar, caímos para cima – declarou. – Eu sei, eu sei, ei, ei, ei.

Aos risinhos, o bobo rolou para longe, pôs-se em pé de um salto e fez uma pequena dança.

Tentando tirar o melhor proveito da situação, o meistre deu um frágil sorriso e esforçou-se para se erguer, mas sua bacia doía tanto que, por um momento, chegou a temer que a tivesse quebrado de novo. Sentiu-se sendo agarrado por baixo dos braços por mãos fortes que o puseram em pé.

– Obrigado, sor – murmurou, virando-se para ver qual dos cavaleiros tinha vindo ajudá-lo…

– Meistre – disse a Senhora Melisandre, com a voz profunda temperada com a música do mar de Jade. – Deveria tomar mais cuidado.

Como sempre, trajava vermelho dos pés à cabeça, com um longo vestido solto de seda esvoaçante, brilhante como fogo, com longas mangas pendentes e profundos cortes no corpete, pelos quais se entrevia um tecido mais escuro, vermelho-sangue, que usava por baixo. Tinha em torno da garganta uma gargantilha de ouro vermelho, mais apertada do que qualquer corrente de meistre, ornamentada com um único grande rubi. O cabelo não era de tom alaranjado ou cor de morango dos ruivos comuns, mas de um profundo acobreado lustroso que brilhava à luz das tochas. Até seus olhos eram vermelhos… Mas a pele era lisa e branca, imaculada, clara como leite. E era esguia, graciosa, mais alta que a maior parte dos cavaleiros, com seios fartos, cintura estreita e um rosto em forma de coração. Os olhos dos homens que a encontravam não se afastavam facilmente, nem mesmo os de um meistre. Muitos diziam que era bela. Mas não era. Era vermelha, e terrível, e vermelha.

– Eu… lhe agradeço, senhora.

– Um homem da sua idade deve ver onde pisa – Melisandre disse cortesmente. – A noite é escura e cheia de terrores.

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