– Exatamente. Compreendi que, apesar da sua invisibilidade, a lancha não podia estar longe. Imagineime no lugar de Small e pensei no que faria nesse caso. Ele provavelmente achou que mandar a lancha de volta ou guardá-la num cais seriam maneiras de facilitar a perseguição se a polícia estivesse na pista dele. Como poderia escondê-la e tê-la à mão quando precisasse? Então pensei no que eu faria se me visse numa situação dessas. Só havia um meio. Levar a lancha a um estaleiro para mudar suas características. Poderia então voltar para o ancoradouro, onde ficaria realmente escondida e, ao mesmo tempo, à minha disposição em poucas horas.
– Parece simples.
– São exatamente estas coisas simples que costumam passar despercebidas. Decidi trabalhar nesse sentido. Parti naquele inofensivo traje de marinheiro e perguntei em todos os estaleiros rio abaixo, e nada consegui saber em 15; mas no décimo sexto – no Jacobson – eu soube que a
– Você planejou tudo muito bem, sejam ou não os nossos homens – disse Jones. – Mas se o caso estivesse nas minhas mãos, eu deixaria um grupo de policiais no estaleiro Jacobson e prenderia todos eles quando chegassem.
– Isso não ocorreria nunca. Este Small é muito vivo. Mandará alguém na frente e se houver alguma coisa suspeita, adiará a viagem para a outra semana.
– Mas podia ter seguido Mordecai Smith, e assim descobriria o esconderijo.
– E teria perdido o meu dia. Aposto cem contra um como Smith não sabe onde eles estão. Enquanto ele tiver bebida e bom pagamento, por que faria perguntas? Eles mandam recados. Já pensei em todas as possibilidades, e esta é a melhor.
Quando passamos diante do centro financeiro e comercial de Londres, os últimos raios de sol douravam o alto da Catedral de St. Paul. Quando chegamos à Torre, o crepúsculo deixava a cidade na penumbra.
– Lá está Jacobson’s Yard – disse Holmes, apontando para um local cheio de mastros e apetrechos de navio para os lados do Surrey. Vamos cruzar devagarzinho por aqui, encobertos por estas filas de barcaças.
Tirou do bolso um binóculo e ficou observando a margem por algum tempo.
– Estou vendo a minha sentinela no seu posto – observou – mas não há sinal do lenço.
– Se descêssemos um pouco o rio e esperássemos por eles – sugeriu Jones, ansioso.
Nesse momento estávamos todos ansiosos, até os policiais e os tripulantes, que tinham uma idéia muito vaga do que estava para acontecer.
– Não temos o direito de achar que a vitória está garantida – respondeu Holmes. – É quase certo, dez contra um, que eles descerão o rio, mas quem poderá garantir? Daqui nós vemos a entrada do estaleiro e eles não poderão nos ver. A noite será clara e cheia de luzes. Devemos ficar onde estamos. Veja como as pessoas se amontoam em torno do cercado.
– Estão saindo do trabalho no estaleiro.
– Gentinha suja, mas todos eles têm em si uma centelha imortal. Ao olhar para eles, ninguém diria isso. Estranho enigma é o homem.
– Há quem diga que é uma alma escondida num animal – comentei.
– Winwood Reade trata bem do assunto – disse Holmes. – Ele nota que, embora o homem seja individualmente um enigma insolúvel, quando está em grupo torna-se uma certeza matemática. Por exemplo, você não pode nunca prever com exatidão o que um homem vai fazer, mas pode prever o que um grupo fará. Os indivíduos variam, mas as coletividades são constantes. É o que dizem os estatísticos. Não é um lenço? Com toda a certeza vejo uma coisa branca flutuar.
– É o nosso rapaz – gritei. – Posso vê-lo muito bem.
– E ali vai a
Ela tinha deslizado, sem ser vista, pela entrada do estaleiro e passado entre algumas pequenas embarcações, de modo que pôde tomar uma grande dianteira antes que a víssemos. Agora ela descia o rio rente à margem numa corrida vertiginosa. Jones olhava com expressão séria e disse, sacudindo tristemente a cabeça:
– Ela é muito rápida. Duvido que a alcancemos.