– Eu gostaria de poder contar com a sua orientação, sr. Holmes. Esta é uma tarefa difícil pra mim, e se eu me sair mal, Lewes vai me repreender.
Aconselhei-o a mandar chamar seu superior imediato e um médico, e também que não permitisse que nada fosse removido, e que fizessem a menor quantidade possível de pegadas até que eles chegassem. Enquanto isso, dei uma busca nos bolsos do homem morto. Encontrei um lenço, uma faca grande e uma pequena caixa de cartas de baralho dobrada. Desta caixa saía a ponta de um papel, que desdobrei e entreguei ao policial. Nele estava escrito, numa caligrafia malfeita de mulher: “Estarei lá, pode ter certeza. – Maudie.” Podia ser interpretado como um caso de amor, um encontro amoroso, embora não houvesse menção a data e lugar. O policial pôs o papel novamente na caixa de baralho e a enfiou, junto com as outras coisas, no bolso do sobretudo. Então, como não me ocorresse mais nada, voltei para minha casa a fim de tomar o café-da-manhã, depois de ter providenciado para que se desse uma busca completa no sopé do penhasco.
Uma ou duas horas depois, Stackhurst estava de volta para dizer-me que o corpo havia sido removido para o Gables, onde seria feito o inquérito policial. Trouxe algumas informações graves precisas. Como eu esperava, nada foi encontrado nas pequenas cavernas na base do penhasco, mas eles haviam examinado os papéis na escrivaninha de McPherson, e muitos deles revelavam uma correspondência íntima com uma certa srta. Maud Bellamy, de Fulworth. Então identificamos a autora do bilhete.
– A polícia tem as cartas – ele explicou. – Não pude trazê-las. Mas não há dúvida de que aquele era um verdadeiro caso de amor. Entretanto, não vejo motivo para associar o caso a este acontecimento terrível, a não ser pelo fato de que a moça havia marcado um encontro com ele.
– Mas dificilmente numa piscina que todos vocês costumavam freqüentar – eu comentei.
– Foi por mero acaso – ele disse – que muitos estudantes não estivessem com McPherson.
– Será que foi um mero acaso?
Stackhurst franziu as sobrancelhas, pensativo.
– Ian Murdoch os reteve – disse –, ele insistiu com os estudantes para uma demonstração de álgebra antes do café. Pobre sujeito, está completamente arrasado com tudo isso.
– Entretanto, cheguei à conclusão de que eles não eram amigos.
– Houve uma época em que eles não eram amigos. No entanto, há um ano ou mais, Murdoch tem estado mais próximo de McPherson do que já esteve de qualquer outra pessoa. Ele não é muito simpático por natureza.
– Foi o que entendi. Acho que você me contou uma vez a respeito de uma briga porque ele maltratou um cachorro.
– Isso já foi esquecido.
– Mas talvez tenha deixado algum sentimento de vingança.
– Não, não, tenho certeza de que eles eram amigos de verdade.
– Bem, então devemos investigar o caso da moça. Você a conhece?
– Todo mundo a conhece. Ela é a beldade do lugar – uma verdadeira beldade, que despertaria atenção em qualquer lugar. Eu sabia que McPherson sentia-se atraído por ela, mas não sabia que o caso tinha ido tão longe quanto essas cartas parecem indicar.
– Mas, quem é ela?
– Ela é filha do velho Tom Bellamy, que é dono de todos os barcos e barracas em Fulworth. Ele começou como pescador, e agora é homem de algumas posses. Ele e seu filho William tocam o negócio.
– Vamos até Fulworth para vê-los?
– Com que pretexto?
– Oh! podemos achar facilmente um pretexto. Afinal de contas esse pobre homem não maltratou a si mesmo desta maneira brutal. Alguma mão humana estava segurando o cabo daquele chicote, se de fato foi um chicote que causou os ferimentos. O seu círculo de amizades neste lugar solitário certamente era limitado. Vamos em seu encalço, em todas as direções, e dificilmente deixaremos de descobrir o motivo do crime, o que, por sua vez, poderá levar-nos ao criminoso.
Teria sido um passeio agradável pelos declives perfumados pelos tomilhos, se as nossas mentes não estivessem envenenadas pela tragédia que havíamos testemunhado. A aldeia de Fulworth fica num vale e estende-se num semicírculo em volta da baía. Atrás do antigo povoado, nas encostas, foram construídas várias casas modernas. Foi para uma destas casas que Stackhurst me conduziu.
– Esta é The Haven, como Bellamy a batizou. A que tem uma torre no canto e telhado de ardósia. Nada má para um homem que começou do nada. Por Deus, olhe ali!
O portão do jardim da The Haven foi aberto e um homem saiu. Não havia como confundir aquela figura alta, angulosa, solitária. Era Ian Murdoch, o matemático. Logo depois nos defrontamos com ele na estrada.
– Olá! – disse Stackhurst. O homem saudou-nos com a cabeça, olhou-nos de soslaio com seus estranhos olhos escuros, e teria passado direto por nós, mas seu superior o fez parar.
– O que é que você está fazendo aqui? – ele perguntou.
O rosto de Murdoch ficou vermelho de raiva. – Sou seu subordinado senhor, debaixo do seu teto. Mas não tenho que lhe dar satisfações de minhas atitudes particulares.