– Este será o seu nome esta tarde, Watson. Você irá visitar o barão Gruner. Sei alguma coisa a respeito de seus hábitos, e às 20:30h ele provavelmente estará livre. Um bilhete avisará antes que você vai visitá-lo, e você dirá que está levando um exemplar de um aparelho de porcelana Ming muito raro. Você pode também ser um médico, já que este é um papel que você pode desempenhar sem duplicidade. Você é um colecionador, este aparelho lhe chegou às mãos, você ouviu falar do interesse do barão pelo assunto e não se recusa a vendê-lo por um determinado preço.
– Que preço?
– Boa pergunta, Watson. Você certamente se daria mal se não soubesse o preço de sua mercadoria. Este pires foi sir James que conseguiu para mim, e suponho que faça parte da coleção do cliente dele. Você não estará exagerando se disser que dificilmente pode haver outra peça igual no mundo.
– Eu poderia sugerir que o aparelho fosse avaliado por um especialista.
– Excelente, Watson! Você está brilhante hoje. Sugira Christie ou Sotheby. A sua delicadeza impede que você mesmo determine o preço.
– E se ele não quiser me receber?
– Oh, sim, ele o receberá. Ele sofre da mania de coleção sob a forma mais aguda – e principalmente deste tipo de coleção, porque é uma autoridade reconhecida neste assunto. Sente-se Watson, e eu ditarei a carta. Não há necessidade de resposta. Você simplesmente dirá que vai vê-lo e por quê.
A carta era um documento admirável, curto, polido e estimulante para a curiosidade de um connaisseur. Foi enviada por um mensageiro. Na mesma noite, com o precioso pires na mão e o cartão do dr. Hill Barton no bolso, parti para a minha aventura.
A beleza da casa e dos jardins indicava que o barão Gruner era, como sir James havia dito, um homem muito rico. Um acesso longo e curvo, com arbustos raros de ambos os lados, dava numa grande praça de cascalho adornada com estátuas. A casa foi construída por um rei do ouro sul-africano, nos dias do grande boom, e a casa comprida e baixa, com suas pequenas torres nas extremidades, apesar de ser um pesadelo arquitetônico, era imponente em seu tamanho e solidez. Um mordomo, que mais parecia um bispo, me fez entrar e entregou-me a um lacaio vestido com roupa de pelúcia, que me levou à presença do barão.
Ele estava de pé diante de uma grande estante aberta que ficava entre as janelas e que continha parte de sua coleção chinesa. Quando entrei, ele virou-se, tendo na mão um pequeno vaso marrom.
– Queira sentar-se, por favor, doutor – ele disse. – Eu estava examinando meus tesouros e me perguntando se poderia arcar com despesas para aumentar esta coleção. Este pequeno exemplar Tang, que data do século VII, provavelmente lhe interessaria. Tenho certeza de que nunca viu artesanato mais admirável ou um polimento mais magnífico. O senhor trouxe o pires Ming de que falou?
Desembrulhei-o cuidadosamente e o entreguei a ele. Ele sentou-se à sua escrivaninha, puxou a lâmpada, pois estava ficando escuro, e passou a examiná-lo. A luz amarela batia em seu rosto, e pude observá-lo atentamente.
Era de fato um homem bonito. Sua fama européia de beleza era inteiramente merecida. Sua altura era mediana, mas ele tinha traços graciosos e enérgicos. Seu rosto era moreno, quase oriental, com grandes olhos escuros e lânguidos que podiam facilmente provocar uma fascinação irresistível nas mulheres. Seu cabelo e o bigode eram negros e lustrosos, e o bigode era curto, pontudo e cuidadosamente encerado. Seus traços eram regulares e agradáveis, com exceção de sua boca reta de lábios finos. Se alguma vez vi a boca de um assassino, ali estava ela – um talhe cruel e duro em seu rosto, cerrada, inexorável e terrível. Ele não deveria ter afastado o bigode da boca deixando-a descoberta, pois ela era um sinal de perigo, um aviso da natureza às suas vítimas. Sua voz era sedutora e suas maneiras perfeitas. Quanto à idade, eu teria calculado um pouco mais de 30 anos, embora seu registro mostrasse mais tarde que ele tinha 42.
– Muito bonito, realmente muito bonito! – ele disse depois de algum tempo. – E o senhor diz que tem um jogo com meia dúzia deles. O que me intriga é que eu não tenha ouvido falar de peças tão magníficas. Eu sabia de apenas um na Inglaterra que poderia se comparar a este, mas com certeza não está à venda. Seria indiscrição se eu lhe perguntasse, dr. Hill Barton, como o obteve?
– Será que isto realmente tem importância? – perguntei com o ar mais displicente que consegui exibir. – O senhor pode ver que a peça é genuína, e quanto ao valor, eu me contento em aceitar a avaliação de um perito.
– Muito misterioso – disse ele com um brilho rápido e desconfiado em seus olhos escuros. Quem negocia com objetos tão valiosos quer saber tudo sobre a transação. Que a peça é genuína, é certo. Não tenho nenhuma dúvida a esse respeito. Mas suponha – sou obrigado a levar em consideração todas as possibilidades – que mais tarde fique provado que o senhor não tinha o direito de vendê-la?
– Eu lhe daria uma garantia contra qualquer alegação deste tipo.