– Não; suas necessidades eram simples e ele ganhava bem. Havia economizado algumas centenas de libras e nós íamos nos casar no início do próximo ano.
– Sinais de alguma perturbação mental? Vamos, srta. Westbury, seja absolutamente franca conosco.
O olhar atento do meu amigo havia notado alguma mudança na atitude dela. A moça enrubesceu e hesitou.
– Sim – disse, finalmente –, eu tinha percebido que havia qualquer coisa na cabeça dele.
– Há quanto tempo?
– Somente na última semana, ou um pouco mais. Ele andava pensativo e preocupado. Uma vez eu lhe perguntei sobre isso. Ele admitiu que havia alguma coisa, relacionada com a sua vida profissional. Ele me disse: “É sério demais para que eu fale sobre isso, até mesmo a você.” Não consegui arrancar mais nada dele.
Holmes ficou sério.
– Continue, srta. Westbury. Mesmo que pareça prejudicá-lo, continue. Não sabemos o que pode resultar disso.
– Na verdade, não tenho mais nada a dizer. Por uma ou duas vezes tive a impressão de que ele estava para me contar alguma coisa. Certa noite referiu-se à importância do segredo, e eu me lembro de ele dizer que, sem dúvida, espiões estrangeiros pagariam um bom dinheiro pelos planos.
Sherlock ficou ainda mais sério.
– Disse que éramos negligentes a respeito desses assuntos – que seria fácil para um traidor apoderar-se dos planos.
– E ele fez esses comentários apenas nos últimos dias?
– Sim, recentemente.
– Fale-nos, agora, da última noite.
– Nós íamos ao teatro. A neblina estava tão forte que não adiantava tomar um carro. Fomos andando e no caminho passamos perto do escritório. De repente, ele sumiu no meio da neblina.
– Sem dizer uma palavra?
– Soltou uma exclamação, e foi tudo. Eu fiquei esperando, mas ele não voltou. Então, fui para casa. Na manhã seguinte, depois que abriram o escritório, eles vieram perguntar. Por volta do meio-dia ficamos sabendo da notícia horrível. Oh, sr. Holmes, se o senhor pudesse pelo menos salvar-lhe a honra. Representava tanto para ele!
Holmes balançou tristemente a cabeça.
– Vamos, Watson, temos mais coisas pela frente. Nossa próxima parada é o escritório de onde foram retirados os documentos.
– Se tudo era contra o rapaz antes, agora piorou ainda mais – Holmes comentou quando o táxi partiu. – Seu casamento dá um motivo para o roubo. Naturalmente ele precisava de dinheiro. Estava com a idéia na cabeça, já que mencionou o assunto. Ele quase transformou a noiva numa cúmplice, revelando-lhe seus planos. Tudo muito mal.
– Mas, Holmes, afinal de contas seu caráter não vale nada? Por que ele deixaria a noiva no meio da rua e fugiria para cometer um crime?
– É isso aí! Claro que há objeções. Mas é um caso extraordinário que tem de ser explicado.
O sr. Sidney Johnson, o funcionário graduado, recebeu-nos no escritório com o respeito que o cartão de visitas de Holmes sempre impunha. Era um homem magro, carrancudo, de meia-idade, que usava óculos, e estava com o rosto encovado e as mãos trêmulas em conseqüência da tensão nervosa a que fora submetido.
– Horrível, sr. Holmes, horrível. Ouviu falar da morte do chefe?
– Estamos vindo da casa dele.
– O lugar está uma bagunça. O chefe, morto, Cadogan West, morto, nossos documentos, roubados. E na segunda-feira, às 17 horas, quando trancamos o escritório, éramos tão eficientes quanto qualquer outro departamento a serviço do governo. Meu Deus, é horrível pensar nisso! Que West, entre todos, pudesse fazer uma coisa assim?
– Então o senhor tem certeza de que ele é o culpado?
– Não vejo outra explicação. E mesmo assim, confiava nele tanto quanto em mim mesmo.
– A que horas fecharam o escritório na segunda?
– Às cinco.
– O senhor mesmo o trancou?
– Sou sempre o último a sair.
– Onde estavam os planos?
– No cofre. Eu mesmo os coloquei lá.
– Existe algum vigia para o prédio?
– Sim, mas ele tem outros departamentos para vigiar também. É um velho soldado e homem de inteira confiança. Ele não viu nada naquela noite, pois havia a neblina.
– Suponhamos que Cadogan West quisesse entrar no edifício tarde da noite; ele precisaria de três chaves para conseguir pôr as mãos nos documentos, não é verdade?
– Sim, de fato. A chave da porta externa, a chave do escritório e a chave do cofre.
– Sir James Walter e o senhor eram os únicos que tinham essas chaves?
– Eu não tenho as chaves das portas, só a chave do cofre.
– Sir James era um homem de hábitos regulares?
– Sim, creio que sim. Pelo que sei, as três chaves sempre ficavam com ele, no mesmo porta-chaves. Eu sempre as via ali.
– Ele levou o porta-chaves com ele para Londres?
– Ele disse que sim.
– O senhor sempre ficou com sua chave?
– Sempre.
– Então, Cadogan West, se for o culpado, devia ter uma duplicata. Mas não foi encontrada com ele. Outra coisa: se um funcionário deste departamento quisesse vender os planos, não seria mais simples ele copiar os planos do que levar os originais, como foi feito?
– Seria necessário um grande conhecimento técnico para copiar os planos de forma eficiente.