Estava doente quando o levaram até ali. A tosse que o vinha atormentando desde a batalha piorara, e tinha sido também atacado por uma febre. Seus lábios racharam, enchendo-se de bolhas sangrentas, e o calor da cela não o impedira de ter calafrios.
Davos descobriu rapidamente que nisso se enganava, tal como em muitas outras coisas. Lembrava-se vagamente de mãos gentis e de uma voz firme, e do jovem Meistre Pylos a olhá-lo de cima. Deram-lhe caldo quente de alho para beber e leite de papoula para lhe tirar as dores e os arrepios. A papoula fez com que dormisse, e enquanto dormia colaram sanguessugas na sua pele, para drenar o sangue ruim. Pelo menos fora isso que concluíra das marcas de sanguessugas que tinha nos braços quando acordou. Pouco tempo depois, a tosse parou, as bolhas desapareceram, e o caldo começou a vir com pedaços de peixe branco, e também cenouras e cebolas. E um dia percebeu que se sentia mais forte do que se sentira desde que o
Tinha dois carcereiros para cuidar de si. Um era largo e atarracado, com grandes ombros e mãos enormes e fortes. Usava uma brigantina de couro pontilhada de tachões de ferro, e uma vez por dia trazia a Davos uma tigela de mingau de aveia. Às vezes adoçava-a com mel ou despejava nela um pouco de leite. O outro carcereiro era mais velho, curvado e pálido, com cabelos oleosos, sujos, e pele áspera. Usava um gibão de veludo branco com um anel de estrelas bordado no peito, em fio de ouro. Caía mal nele, ao mesmo tempo curto e largo demais, e estava sujo e rasgado. Esse trazia a Davos pratos de carne com purê, ou guisado de peixe, e uma vez até tinha lhe trazido metade de um empadão de lampreia. A lampreia estava tão condimentada que Davos não conseguira mantê-la no estômago, mesmo assim era um raro acepipe para um prisioneiro numa masmorra.
Nem sol nem luz brilhavam nas masmorras; nenhuma janela perfurava as espessas paredes de pedra. A única maneira de distinguir o dia da noite era através dos carcereiros. Nenhum dos homens falava com ele, embora Davos soubesse que não eram mudos; às vezes ouvia-os trocar algumas palavras rudes na troca da guarda. Nem sequer lhe disseram como se chamavam, por isso deu-lhes nomes inventados. Ao baixo e forte chamou Mingau, ao curvado e pálido, Lampreia, devido ao empadão. Marcava a passagem dos dias pelas refeições que eles traziam e pelas trocas de archotes na arandela fora de sua cela.
Na escuridão, um homem sente-se só e anseia pelo som da voz humana. Davos dirigia-se aos carcereiros sempre que eles vinham à cela, fosse para lhe trazer comida, fosse para trocar o balde dos dejetos. Sabia que os homens seriam surdos a súplicas por liberdade ou misericórdia; em vez disso fazia-lhes perguntas, na esperança de que talvez um dia algum deles pudesse responder. “Que notícias há da guerra?”, perguntava, e “O rei está bem?”. Pedia notícias do filho Devan, e da Princesa Shireen, e de Salladhor Saan. “Como anda o tempo?”, perguntava, e “As tempestades de outono já começaram?”, “Os navios ainda percorrem o mar estreito?”.
Não importava o que perguntava; eles nunca respondiam, embora às vezes Mingau lhe dirigisse um olhar, fazendo Davos pensar durante meio segundo que ele se preparava para falar. Com o Lampreia nem isso havia.